Estamos a entrar numa nova fase da vida do primeiro-ministro (PM) António Costa. Em termos de leitura política, é lícito concluir que Costa não comanda o Governo pois este é comandado pelos seus ministros e secretários de Estado, sendo que qualquer escândalo irá atingir diretamente o PM, a quem o Presidente da República (PR) deu um ano para resolver a instabilidade gerada pelos membros do Governo.
O PM passou – infelizmente para a estabilidade democrática – a viver o dia a dia num contexto em que o escândalo de hoje é maior do que o escândalo de ontem. Esta é a dura realidade do chefe do Executivo. E esta semana, no parlamento, viu-se como o PM alterou o que tinha dito exatamente há uma semana e como tenta envolver todos os ministros no dia a dia e no controlo dos secretários de Estado.
Estas circunstâncias tornam o trabalho no Governo insustentável em termos organizacionais, de eficiência ou mesmo psíquicos. António Costa possivelmente não dormirá uma noite descansado com receio daquilo que será a capa do “CM” na madrugada seguinte.
Lembramo-nos que uma situação semelhante só aconteceu nos anos 90 do século passado, aquando de um dos governos de Aníbal Cavaco Silva, em que existia o mesmo tipo de ansiedade perante as capas de final de semana do então “Independente”, liderado por Paulo Portas.
António Costa tem maioria parlamentar, mas a verdade é que esse facto pode não corresponder à realidade, pois o PR Marcelo Rebelo de Sousa mantém intactas as suas capacidades constitucionais de dissolver o Governo a qualquer altura.
Mais. Os escândalos não estão só no Governo, mas também em várias autarquias lideradas pelo PS e numa delas, a de Espinho, os destroços atingem também um deputado do PSD e ex-autarca e próximo de Luís Montenegro. O facto de ter atingido este parlamentar tem um alvo específico: os estilhaços podem atingir o PSD.
Pelo meio, é claro o crescimento de partidos que estiveram em franca ascensão nas últimas legislativas, o Chega e a Iniciativa Liberal (IL).
A política em Portugal está podre e os partidos mais recentes e sem expressão autárquica têm “batido” no Governo, e a expetativa de um crescimento acelerado vai já sentir-se nas próximas eleições europeias. Por outro lado, ainda em revista do que se passou nos últimos dias, em que o PM não deu apenas parte do braço mas o braço todo, Costa passou a criticar o que há uns dias era legal e os spins doctors de S. Bento convenceram António Costa de que tem de arranjar mecanismos de escolha dos próximos governantes.
A grande questão que se coloca é se o escrutínio será feito apenas com o recurso a informação que os próprios dão, ou se a informação é cruzada por organismos de investigação nacionais ligados aos serviços secretos, como aliás acontece em outros países europeus.
No meio da insatisfação geral está a falta de credibilidade dos políticos e o mediatismo necessário que contrasta com a inacessibilidade que leva ao respeito dos poderes instituídos. A agitação social reflete essa falta de respeito, mas também demonstra que partidos que ficaram sem expressão nas eleições continuam com as máquinas partidárias a funcionar e têm capacidade de fazer paralisações, marcar greves e definir o futuro de determinados setores e empresas. No regresso aos anos 90, que ilações se podem tirar?