Esta semana muitos falarão sobre o Orçamento do Estado mas, por isso mesmo, entendi partilhar aqui um outro assunto surgido na sequência de tudo aquilo que se passa a nível mundial no sentido de responder, de forma coerente e organizada, às questões suscitadas pela pandemia. Tema esse com o qual só algumas pessoas mais atentas terão sido confrontadas, após a leitura de uma notícia inusitada publicada pelo reputado “Financial Times”.

Nesse artigo, que noutro jornal poderia não ser tão levado a sério, um título disfarçado sob um tom entre o bombástico e o simpático proclamava que a OCDE esteve, durante um ano, a preparar uma “revolução fiscal global”, cujo impacto se pretende equivalente a 100 mil milhões em termos de receitas anuais e a 4% em média no desconto adicional para cada empresa.

O raciocínio avançado para esta medida é na aparência diplomaticamente hábil, porque baseado num pressuposto demagógico, mas na verdade política e factualmente inepto.

A OCDE, ao argumentar para sustentar o lançamento público desta medida, afirma que o que pretende é que as multinacionais mais lucrativas paguem impostos a distribuir pelos países onde não estão localizadas, como as gigantes tecnológicas ou as empresas de bens de luxo. Em suma, o que a OCDE diz, embora não o explicitando, é que pretende lançar, assim haja vontade dos países chave para a decisão, um imposto transnacional sobre o investimento direto.

Qual é o raciocínio, aliás partilhado no mencionado artigo? O de que “o aumento da eficácia da cobrança de impostos corporativos reduziria um pouco o investimento das multinacionais, mas isso custaria menos de 0,1 por cento do Produto Interno Bruto global”. Ao dizer isto, obviamente, a OCDE está na verdade a dar um passo maior do que as pernas que tem. E claro que se presta meramente a servir de para-choques para testar a receção a uma medida que poderá – ou não – a vir depois ser formalizada pela Comissão Europeia.

Tenho que ser claro; sou pró-Europa e, como democrata-cristão, integralmente avesso a discursos nacionalistas. Mas não posso deixar passar tentativas como esta para, sob o capote da taxação das empresas alegadamente mais ricas, criar um precedente que significa algo que não está considerado nos Tratados europeus. A OCDE não pode, nem deve, funcionar como testa de ferro para a introdução de temas políticos numa agenda que, para a organização em causa, deveria ser a do crescimento económico e do desenvolvimento.

Devem as grandes empresas transnacionais pagar mais impostos em territórios onde agora operam à margem de uma desejável harmonização fiscal? Desejavelmente sim. Mas nunca passando ou sobrepondo os Governos nacionais e entidades como a União Europeia, que tanto trabalho têm tido para conseguir uma plataforma de entendimento político mas também fiscal, que não pode ser colocado em causa por iniciativas como esta.

 

Enquanto escrevo estas linhas ainda decorre a Volta a Itália, mas seja qual for o resultado final da ‘Giro’, a corrida terminará sempre com uma nota extremamente positiva para dois ciclistas portugueses; João Almeida (Deceuninck-QuickStep) e Ruben Guerreiro (Education First). Mantendo a tradição portuguesa de resistência e endurance, estes dois atletas darão certamente ainda muito que falar no ciclismo internacional.

 

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