A nomeação do novo governo português surge num momento crucial, em particular pela oportunidade singular de redefinir o seu futuro económico e social. No centro desta oportunidade está a necessidade de discutir alinhadamente uma verdadeira transformação digital (e não digitalização) no nosso país, para garantir a sua competitividade para a próxima década.

Este é o momento de Portugal não incorporar apenas tecnologias nos seus processos existentes, mas de repensar e redesenhar um país ágil e digitalmente alinhado com os desafios da década que inicia em 2030, baseado em três pilares: competitividade, inovação e qualidade de vida.

A digitalização, embora necessária, limita-se à adoção de tecnologias digitais capazes de converter processos analógicos em digitais. É um primeiro passo, mas insuficiente para responder às exigências de um mundo em rápida evolução.

Transformar digitalmente um país, por outro lado, é um processo mais ambicioso e abrangente, envolvendo a reestruturação de sistemas, dos processos e modelos de negócio do Estado (como um todo) e da sua Administração Pública, aproveitando as tecnologias digitais para criar formas inovadoras de operar e de entrega de valor.

É, neste último conceito, que reside a verdadeira oportunidade para Portugal, criando um modelo transversal de Simplex Digital, o que implicará que cada ministério olhe para o serviço público prestado com a missão de “começar de novo”, sem dogmas do passado.

Implica pensar: “E se tudo começasse hoje com a tecnologia de hoje?”. Com este repensar e oportunidade disponível, terá a possibilidade de encontrar e identificar o seu valor acrescentado, criando um caminho de mudança estrutural de médio-longo prazo. Naturalmente, há muitos desafios de curto prazo para investir, mas um país não pode hipotecar o seu futuro, pelo que deve já hoje iniciar este passo exigente de preparação para um novo “degrau” do futuro que se avizinha.

Se pensamos que estamos sozinhos nesta caminhada, ou que estamos a evoluir bem, a realidade é que pese os esforços meritórios e fundamentais realizados nos últimos anos, necessitamos de ambicionar muito mais. Olhemos para os melhores, onde a Dinamarca e a Estónia conseguiram colocar as tecnologias e o mundo digital no ADN da própria sociedade.

A transformação digital oferece ao novo governo a oportunidade de reinventar a economia portuguesa, promovendo setores de alta tecnologia e inovadores, que podem posicionar o país como um líder na Europa e no mundo. Investir em transformação digital significa mais do que simplesmente automatizar tarefas; significa criar um ecossistema que favoreça a inovação contínua, a eficiência e a competitividade global, para além de dinamizar ainda mais a eficiência na Administração Pública.

Contudo, para que esta transformação seja efetiva e sustentável, é fundamental que o investimento vá além da infraestrutura tecnológica. É necessário preparar a população para as exigências deste novo paradigma, o tal ADN incorporado na sociedade, através de uma educação focada não só em competências digitais básicas, mas também em pensamento crítico, criatividade e de adaptabilidade. A exigência digital deve ser vista como um meio para capacitar os cidadãos a prosperar neste novo contexto, e não apenas como uma forma de facilitação digital.

Acrescento ainda, o facto de a transformação digital ser inclusiva, garantindo que todos os segmentos da população tenham acesso às oportunidades que ela cria. Isso significa investir em conectividade em áreas rurais e desfavorecidas, permitindo ser também um incentivo a movimentos de deslocação para o interior, bem como em programas de formação e requalificação para os trabalhadores afetados pela automação.

Só assim será possível garantir que os benefícios da transformação digital sejam amplamente partilhados, minimizando as diferenças no acesso à eficiência trazida pela tecnologia, contribuindo para uma melhoria significativa na qualidade de vida de todos os portugueses.

O novo governo português está, portanto, diante de uma janela de oportunidade para moldar o futuro do país. Ao optar pela transformação digital, e não apenas pelo “despejar” dinheiro em digitalização, tem a oportunidade de colocar Portugal na vanguarda da inovação e da competitividade global. Preparar a população para as próximas gerações, garante que Portugal não estará apenas a acompanhar a tendência digital global, mas assumir que a pode liderar.

Estamos provavelmente numa das últimas janelas de oportunidade, nas próximas décadas, de voltarmos a estar como um país do pelotão da frente da competitividade e marcando a sua posição como uma nação resiliente, inovadora e próspera no século XXI.