Se fosse necessária uma confirmação de que estamos imersos numa nova Guerra Fria, bastaria olhar para o estado atual das Nações Unidas e o seu funcionamento kafkiano como instituição. Atentem nas notícias mais recentes vindas do Conselho de Segurança: “EUA bloqueiam na ONU pedido de investigação de massacre em Gaza”, “Conselho de Segurança da ONU falha e não adota três resoluções sobre armas químicas” (por veto da Rússia), “Rússia interrompe reunião do Conselho de Segurança sobre os Direitos Humanos na Síria”, “Rússia usou sete vezes o poder de veto na ONU em seis anos de guerra na Síria”, “EUA bloqueiam ação do Conselho da ONU sobre o conflito em Gaza”.

Poderia continuar, mas estas são as notícias referentes aos últimos seis anos em que as guerras no Médio Oriente escalaram para um nível alarmante, transformando a região no palco de combate de diferentes fações e potências internacionais, sem fim à vista.

Criada em 1945 na sequência da Segunda Guerra Mundial, a ONU substituiu a anterior Liga das Nações e estabeleceu-se como organização para promover a cooperação internacional e manter a paz mundial. O seu Conselho de Segurança prevê que um dos cinco membros permanentes – China, França, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos – possa vetar e bloquear a aprovação de qualquer resolução. Quando usados com frequência, estes vetos dão lugar a uma constante inação da parte da comunidade internacional, que se tem revelado impotente para travar os conflitos e cumprir os objetivos das Nações Unidas.

Olhando para o passado da organização, observamos que, no auge da Guerra Fria, as contínuas divisões entre EUA e Rússia paralisaram o funcionamento da instituição. Foi apenas no período pós-Guerra Fria que a ONU voltou a desempenhar um papel mais decisivo. O seu historial de missões de paz tem-se pautado por algum sucesso, mas também fracassos assinaláveis, como a sua incapacidade de travar o início da Guerra do Iraque, com consequências fatídicas. Acrescente-se a isso as acusações de corrupção e gestão ineficiente que têm vindo a minar a sua credibilidade.

A eleição de António Guterres como Secretário-Geral das Nações Unidas inspirou esperança, face ao seu mandato positivo como Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados. Mas, em um ano de mandato, a sua posição como porta-voz da organização revelou-se dececionante e demasiado contida em momentos críticos, sendo incapaz de se impor em tempos mais hostis.

Na nova Guerra Fria – quase quente – atualmente em curso, os valores da missão das Nações Unidas não deixaram de fazer sentido, muito pelo contrário. Para acreditarmos de novo na ONU, é fundamental que a instituição não se deixe paralisar pelas agendas dos seus membros. Deve, isso sim, dar máxima prioridade a uma reforma que a torne mais eficaz e relevante do que alguma vez foi.