Se há matéria em que nenhum partido gosta de assumir uma posição de rutura é a Caixa Geral de Depósitos. Por mais liberais que sejam os governos, por mais que defendam um largo programa de privatizações, há sempre uma entidade que permanece intocada nos programas eleitorais, nos manifestos partidários, nos discursos políticos: a Caixa Geral de Depósitos.
Criada em abril de 1876, a Caixa é tradicionalmente vista como uma espécie de boia de salvação das poupanças nacionais, como a entidade de referência para a concessão de apoios às empresas portuguesas, como o intermediário entre os nossos emigrantes e o país que deixaram há mais ou menos anos para trás.
Recordo-me de, quando era pequeno, os meus pais verem na Caixa uma instituição sólida e confiável, onde podiam guardar os seus magros pecúlios sem correr o risco de os ver desaparecer do dia para a noite.
Desde então, o mundo mudou. E a Caixa também. De banco sólido e confiável, que acumulava, ano após ano, lucros resultantes da sua atividade, a CGD transformou-se em mais um banco de quem os aforradores desconfiam, apresentando sucessivos prejuízos, começando a ser vista como uma agência de emprego de elite de PS e PSD, numa dança de cadeiras que em nada beneficiou o banco público.
Depois de anos e anos sempre no verde, a Caixa Geral de Depósitos resvalou para o vermelho, do qual teima em não sair. E o Estado, como seu único acionista, começou a ter que injetar dinheiro neste autêntico monstro. E esse dinheiro, muitos milhares de milhões de euros vem, claro está, dos contribuintes, que pagam, com os seus impostos, a má gestão que tem vindo a ser levada a cabo pela Caixa.
Em 2016, finalmente, o Partido Socialista descobriu uma solução para salvar a CGD: entregar a sua gestão a pessoas altamente qualificadas, vindas do setor privado, capazes de, mediante salários milionários, tirar do buraco esta instituição centenária. Acontece que, passados muitos e muitos meses, a única coisa que o Dream Team escolhido para liderar a Caixa foi capaz de fazer foi discutir a entrega ou não das suas declarações de rendimentos junto do Tribunal Constitucional. E, tal como chegou, assim partiu, a equipa liderada por António Domingues. Uma perda de tempo e de dinheiro, num momento em que não há tempo e muito menos dinheiro para os lados da Caixa. Segue-se Paulo Macedo, gestor com provas dadas, quer no setor público, quer no privado. Esperemos que seja capaz de inverter o rumo trilhado pela CGD nos últimos anos, mas, independentemente disso, gostaríamos de saber por que não se pode discutir seriamente a questão da privatização da Caixa, bem como a privatização da RTP, da TAP e de outros monstros sagrados.
Desenganem-se aqueles que acham que somos ultraliberais convictos, que advogamos a privatização dos mais importantes setores da economia, que acabe, de vez, com a intervenção do Estado na atividade económica. Não é verdade. Defendemos, apenas, que se deve, certamente, haver saúde pública, educação pública, segurança pública, etc., talvez não faça sentido, nos dias de hoje, ter um banco totalmente público, uma estação de televisão do Estado, uma transportadora aérea nacional, especialmente quando nos dizem, ano após ano, que teremos que os financiar com os nossos impostos.
Não queremos que se privatize por privatizar, queremos, apenas, que não se tenha medo de discutir essa alternativa ao lado de todas as outras, que o assunto não represente um tabu, num tempo célebre por acabar com as vacas sagradas.