Foi publicado, a 21 de Março deste ano, o novo Regulamento da União Europeia que cria um regime de análise dos investimentos diretos estrangeiros na União (Regulamento IDE).

O Regulamento IDE entrou em vigor em ª 10 de Abril de 2019, e é aplicável, a partir de 11 de Abril de 2020, relativamente a operações realizadas a partir de 11 de Julho de 2019.

O Regulamento estabelece um mecanismo de análise de IDE, fundado em razões de segurança e de ordem pública.

O “mecanismo de análise” é um instrumento de aplicação geral que se refere, nomeadamente, a termos e procedimentos para apreciar, permitir e proibir IDE por razões de segurança e de ordem pública.

Fundamentalmente, o “mecanismo de análise” consiste em procedimentos de cooperação que obrigam o Estado-membro a disponibilizar à Comissão e aos outros Estados-membros informações sobre IDE no território do primeiro. As “informações” abrangem a estrutura de propriedade e as atividades do adquirente e do “target”, o valor do investimento e o financiamento e fontes de financiamento.

No caso de a Comissão, ou outro Estado-membro, considerarem que a transação afeta a segurança ou a ordem pública, podem “dar parecer”, ou “apresentar observações” relativamente a essa transação. O Estado-membro deve “tomar devidamente em consideração” as observações e o parecer e, no caso de IDE que pode afetar projetos ou programas de interesse da União, deve “ter na máxima conta” o parecer da Comissão e “fornecer uma explicação à Comissão se não seguir o parecer”.

Como é que devemos olhar para este novo Regulamento?

Quando falamos de IDE, no quadro dos Tratados, estamos a falar de livre circulação de capitais e de direito de estabelecimento. O Tratado proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-membros e entre Estados-membros e países terceiros. Mesmo não sendo “investimento de carteira”, há muito IDE que não se configura como “estabelecimento”, quer dizer, dá poderes ao investidor para participar efetivamente na gestão da empresa, sem possibilidade de a controlar.

Todavia, cada Estado-membro, inclusivamente no quadro dos Tratados, é responsável, no seu território, pela segurança e ordem públicas.

Se esta é uma competência dos Estados-membros, aliás salvaguardada no próprio Regulamento IDE, que sentido terá este novo mecanismo de análise, fundado no artigo 207º do Tratado, quer dizer, nas regras sobre

Política comercial comum, competência exclusiva da União? Será apenas um mecanismo, anódino, de informação da Comissão e dos outros

Estados-membros?

Não! Tal como é habitual, a Comissão nunca dá ponto sem nó, prosseguindo, infatigável, o reforço dos seus poderes.

Reparem no considerando 17 do Regulamento: o Estado-membro deve, nomeadamente, tomar devidamente em consideração o parecer da Comissão, “em consonância com o seu dever de cooperação leal, previsto no artigo 4º, nº 3, do Tratado da União Europeia”.

O que é que isto quere dizer?

Muito embora o “princípio de cooperação leal” não altere a atribuição de competências, é aplicável em todos os âmbitos do ordenamento da União

Europeia. O seu alcance é, não só o de reforçar a eficácia das regras, mas também o de criar deveres positivos do Estado-membro para garantir a plena eficácia das regras. A jurisprudência dos Tribunais da União

Europeia tem-lhe dado o sentido de vincular o Estado-membro a não privar de efeito útil as regras dos Tratados. Daqui resulta, nomeadamente, a seguinte consequência: as competências atribuídas aos Estados-membros devem ser exercidas para garantir o cumprimento dos Tratados. É designadamente o que sucede quando a atividade dos particulares e, designadamente, a atividade dos recipientes de IDE, tiver consequências económicas relativamente a qualquer Estado-membro.

O sentido do novo Regulamento IDE é, assim, o de centralizar as decisões relativas a IDE na Comissão, fazendo da Administração nacional um mero prolongamento da Administração da União.

Ora, sem embargo da lealdade para com a Europa, Portugal sempre foi cidadão do Mundo. O seu dever não está só com a Europa e, muito menos, com a Comissão.

Ficar só com a Europa empobrece Portugal e os portugueses.