A área do terrorismo conheceu um boom de estudos desde o 11 de setembro de 2001. Mas, apesar de todo o universo de literatura produzida até aos dias de hoje, há ainda alguns tópicos por afinar. Antecipar ou prever o envolvimento de alguém com a radicalização violenta é um deles. Quanto a este aspecto os académicos são consensuais: não existe um perfil-tipo e muito menos um processo linear que explique este fenómeno.

Nas décadas de 70 e 80 do século passado, considerava-se que a razão para uma pessoa cometer ataques terroristas residia na psicopatologia. Aliás, que outra explicação poderia haver para alguém ser capaz de acabar com tantas vidas inocentes? Durante a década de 90 e início do século XXI, os estudos passaram para o extremo oposto: considerava-se que as causas e as motivações para o envolvimento na radicalização violenta situavam-se, unicamente, nas circunstâncias associadas às dinâmicas sociais e ambientais, tais como o desemprego, a marginalização, e a desigualdade social.

Mais recentemente, a produção científica nesta área mostra que também poderá existir uma relação entre problemas de saúde mental e o terrorismo. Por exemplo, um estudo desenvolvido nos Países Baixos em 2015 apurou que, entre os radicais que se juntaram ao Daesh na Síria e Iraque, cerca de 60% apresentava pelo menos uma das seguintes condições: problemas de comportamento, desordens da personalidade, perturbação de stress pós-traumático ou alguma perturbação mental.

Porém, os problemas relacionados com o foro mental não são a única explicação, nem devem ser entendidos como o único factor de risco para o envolvimento na radicalização violenta. Há, sim, um percurso feito de avanços e recuos, e um conjunto interrelacionado de factores – sociais, políticos e pessoais – que, num determinado contexto e período da vida, são decisivos para alguém se radicalizar ideologicamente e cometer violência em nome dessa ideologia.

Dada a multiplicidade de causas e desafios associados a esta área, como fazer, então, a prevenção da radicalização violenta? A adopção do modelo de saúde pública parece fornecer uma resposta. Esta abordagem está assente em três níveis de prevenção. Inicialmente, a prevenção primária visa a comunidade como um todo e tem como objectivo atenuar as carências ou injustiças sociais que podem resultar, mais tarde, no envolvimento de pessoas com o terrorismo.

Este nível de prevenção compreende um conjunto de medidas e intervenções que englobam os serviços de saúde e de educação, a manutenção dos valores democráticos e a cidadania activa, e o desenvolvimento pessoal e profissional. A prevenção secundária foca-se nos indivíduos identificados como estando em risco de envolvimento com a radicalização violenta e integra a implementação de intervenções comunitárias e a construção de contra-narrativas para evitar que a pessoa parta para o terrorismo.

Por fim, a prevenção terciária dirige-se a indivíduos radicalizados e envolvidos activamente na causa extremista. As intervenções implementadas neste nível são individualizadas e têm como objectivo o afastamento destas pessoas da violência.

Através de uma abordagem social alargada alicerçada em equipas multidisciplinares – desde técnicos de saúde, de intervenção psicossocial e professores, até agentes das forças e serviços de segurança e decisores políticos – o modelo de saúde pública tem um âmbito holístico e abrangente, que permite unir e intencionalizar esforços e usar recursos já disponíveis para trabalhar as causas, os gatilhos e as motivações da radicalização violenta de forma progressiva, desde a base do problema até ao topo da pirâmide.

Esta abordagem, que tem sido timidamente preconizada por alguns académicos, tem vantagens não apenas para a prevenção e o combate ao terrorismo, como também para outros fenómenos sociais, já que há factores de risco, como o desemprego, que tanto podem servir de gatilho para a radicalização violenta, como para a pequena criminalidade.

Em última análise, o modelo de saúde pública permite a construção e o desenvolvimento de uma sociedade mais saudável, igualitária e segura, de forma sustentável e eficaz, onde a prevenção do terrorismo é feita em todos os níveis envolvendo toda a comunidade.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.