Encargos financeiros suportados por Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS) até 2013 com aquisição de partes de capital.

A Lei do Orçamento de Estado para 2003 alterou o regime de tributação das mais-valias realizadas por SGPS (e outros sujeitos passivos de IRC igualmente abrangidos por este regime), com a introdução da regra de desconsideração da dedutibilidade dos encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital, cuja transmissão onerosa gerasse mais-valias ou menos-valias sem relevância tributária.

Posteriormente, em 2004, a Autoridade Tributária (AT) emitiu uma circular controversa (a Circular 7/2004) através da qual veio sancionar o entendimento de que a desconsideração do custo fiscal de tais encargos financeiros deveria ocorrer no exercício em que os mesmos eram incorridos e não apenas aquando da verificação das condições de aplicação do regime de exclusão de tributação das eventuais mais-valias ou menos-valias realizadas no momento da alienação das partes de capital.

Em termos práticos, foram várias as SGPS que ao longo de uma década viram a sua base tributável em sede de IRC incrementada com a desconsideração de encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital sobre as quais nunca chegaram a beneficiar de qualquer exclusão de tributação de mais-valias: (i) seja porque nunca alienaram tais participações; seja porque, (ii) tendo alienado, não cumpriam as condições de aplicação do regime.

Atenta a evolução legislativa verificada em 2013 e 2014, com a introdução dos regimes de limitação à dedutibilidade dos gastos de financiamento líquidos e de exclusão de tributação das mais-valias realizadas com a transmissão onerosa de partes sociais (i.e. regime do participation exemption), ambos aplicáveis à generalidade dos sujeitos passivos de IRC, a Lei do Orçamento do Estado para 2014 veio revogar o regime especial de tributação das mais-valias e menos-valias realizadas por SGPS e de desconsideração dos encargos financeiros suportados com a respetiva aquisição – então estatuído no artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).

Aqui chegados, colocou-se a questão de saber qual o tratamento fiscal que deveria ser conferido a tais encargos financeiros, nas circunstâncias em que as condições de verificação da aplicação do benefício do artigo 32.º do EBF ainda não se encontravam verificadas: poderia o respetivo custo fiscal ser recuperado pelas SGPS no período de tributação da revogação do regime anterior? No entender da AT não.

Já no entender dos sujeitos passivos que iniciaram processos de contencioso fiscal neste âmbito, a revogação daquele regime antes da alienação das partes de capital relevantes determina a confirmação de que os requisitos para a respetiva aplicação não poderão ser verificados. Consequentemente, a AT encontra-se vinculada a (i) proceder à consideração, como custo fiscal, dos encargos financeiros suportados nos exercícios compreendidos entre 2003 e 2013 com a aquisição de partes de capital sobre as quais nunca chegaram a beneficiar de qualquer exclusão de tributação de mais-valias; e (ii) reembolsar aos sujeitos passivos o IRC liquidado, na parte que se reporta aos mesmos.

Embora estas pretensões tenham sido formalmente recusadas por parte da AT, já começam a ser várias as decisões publicadas pelo Tribunal Arbitral (CAAD) no âmbito destes processos e que vão no sentido de dar mérito aos sujeitos passivos, reconhecendo o direito à consideração fiscal de tais encargos financeiros (em 2014) e, consequentemente, ao reembolso do IRC correspondente.

De facto, recentemente foram publicadas mais duas decisões do CAAD favoráveis aos sujeitos passivos.

Uma vez que 2014 corresponde ao período de tributação em que poderá haver lugar à dedução destes encargos financeiros, importa aferir em que circunstâncias os sujeitos passivos podem vir ainda reivindicar tempestivamente o reconhecimento deste direito. É caso para dizer que o custo de oportunidade de não tentar poderá ser elevado.