A frase “por trás de uma grande fortuna há um crime” é frequentemente atribuída a Balzac, mas na verdade o escritor francês nunca a proferiu, tratando-se de um erro de tradução. A frase original referia-se à riqueza inexplicada e não às fortunas em geral. “Le secret des grandes fortunes sans cause apparente est un crime oublié, parce qu’il a été proprement fait”, escreveu Balzac no romance “O Pai Goriot”, que começou a publicar em 1834. Por outras palavras, o segredo das grandes fortunas que não têm uma causa aparente é um qualquer crime que entretanto caiu no esquecimento, porque foi bem executado.
Quase 200 anos depois, a máxima permanece válida e em Portugal não faltam exemplos de pessoas que enriqueceram sem que se saiba como, incluindo autarcas, deputados e ex-governantes. São situações que fragilizam a democracia, minam a confiança dos cidadãos nas instituições e nos deixam a todos mais pobres.
O problema não é de agora e o povo português há muito que está habituado, mas também é verdade que pouco faz para acabar com esse estado de coisas. A figura do Zé Povinho, criada por Rafael Bordalo Pinheiro, ilustra bem essa forma de estar dos portugueses. Por um lado, com um gesto caraterístico, o Zé Povinho manda os políticos corruptos àquela parte; por outro, resigna-se e encara a corrupção e a má governação como fatalidades, como a chuva ou o granizo, qualquer que seja o regime político.
Porém, o país não tem de se resignar a viver dessa forma e está finalmente a dar passos para quebrar essa sina. A criminalização do enriquecimento ilícito dos titulares de cargos públicos só peca por tardia. Estamos a poucos dias de comemorar o 47.º aniversário da Revolução de Abril e se queremos que a nossa democracia possa sobreviver nas próximas décadas temos de enfrentar de uma vez por todas o problema da corrupção. Não podemos continuar a fazer de conta que este problema não existe e que não impacta na qualidade de vida dos portugueses. Cada euro que o Estado perde devido a atos de corrupção é menos um euro gasto em saúde, educação e serviços públicos de qualidade.