“We may be of the same family, but that is the very reason why we are not friends, for we are rivals for the throne. What quarrels are worse than family quarrels?”

Ana Bolena para a sua irmã mais velha Maria, corte de Henrique VIII

 

As irmãs Bolena, Ana e Maria, foram duas figuras proeminentes na corte do rei Henrique VIII. Maria era a irmã mais velha e inicialmente ganhou a atenção do rei, tornando-se sua amante antes de Ana. Ana, no entanto, cativou o rei e tornou-se sua segunda esposa, um movimento que impactou significativamente a história inglesa com a Reforma. Maria foi submetida a degredo e Ana decapitada.

A rivalidade entre irmãos, os motivos e as consequências na empresa familiar

A rivalidade  entre irmãos em empresas familiares não tem sido rara, com efeitos muitas vezes irreparáveis sobre as suas famílias e empresas. Charles e David Koch, líderes duma das famílias mais ricas dos EUA, foram processados pelos seus irmãos Bill e Fred, por supostamente enganar os irmãos para que estes deixassem a Koch Industries. Mukes e Anil Ambani tiveram uma famosa luta, longa e amarga, pelo controlo da Reliance Industries, a jóia da coroa da família indiana Ambani, quando o Pai morreu sem deixar testamento. O famoso produtor de vinho Robert Mondavi era conhecido por colocar os seus dois filhos um contra o outro, criando uma intensa rivalidade entre irmãos que acabou por prejudicar seriamente a família e o negócio. De facto, há muitos casos porque não faltam razões para rivalidade ou simplesmente separação entre irmãos…

  • a disputa de poder e sucessão
  • diferenças de visão e valores
  • ciúmes e obsessão pela comparação
  • conflitos devido à falta de clareza nas fronteiras e na definição dos papéis entre irmãos
  • influência de cônjuges e familiares – conselhos contrários sobre cada um dos irmãos
  • problemas de comunicação, muitas vezes em ascendente
  • influência de legado familiar exigente na criação de um mau ambiente competitivo

Embora todos tenhamos conhecimento de algumas histórias trágicas provocados por estes ou até outros motivos, na maioria dos casos os irmãos conseguem liderar as suas empresas familiares juntos de forma produtiva e colaborativa. Mas como se consegue que entre irmãos não surjam rivalidades e que sejam capazes de trabalhar tão bem juntos nos negócios de sua família?

A criticidade da educação e do ambiente familiar construído pelos Pais no advento de uma relação harmoniosa, sólida e duradoura entre irmãos

Não é surpresa que os filhos devam ser educados desde cedo na importância do amor e bom relacionamento entre irmãos – especialmente no foro de famílias empresariais. Como não escolhemos os nossos irmãos, a dinâmica de relação é única e tem de ser gerida pelos pais com atenção e tempo.

E quando os irmãos aprendem a relacionar-se positivamente uns com os outros e a gerir conflitos de forma eficaz desde cedo, beneficiam de relações saudáveis e solidárias entre si que se refletem na sua personalidade e na capacidade de gestão de qualquer relação ao longo da sua vida. E no que toca ao futuro papel de cada irmão na empresa, que os pais devem pensar nisso com anos de antecedência – bem antes de pedirem aos filhos para entrar na empresa familiar. Desde tenra idade, as crianças precisam de saber resolver conflitos e ter foco na cooperação e na comunicação aberta. “Se os pais puderem ajudar os filhos a encontrar palavras para falar sobre suas reações e sentimentos complexos, isso pode prepará-los para estreitas relações de entreajuda entre irmãos ao longo da vida”, diz a Prof. Laurie Kramer da Northeastern University.

Os pais desempenham assim um papel crucial na formação das relações entre irmãos. Quando os pais estão presentes e transmitem amor e segurança, quando evitam comparações entre os irmãos, mesmo nos menores detalhes, ou quando não tratam os filhos de forma diferente e visível para os irmãos, os filhos são menos propensos a competir pelo afeto e atenção dos pais e vão ser, por sua vez, mais eficazes e mais próximos uns dos outros na sua atividade profissional. Em contrapartida, quando as rivalidades entre irmãos se transferem para a empresa familiar, esse é o principal gatilho para as famosas guerras sucessórias entre irmãos – as que se conhecem fora, as que se passam discretamente atrás das portas fechadas da casa da família e claro as ficcionais onde pontifica a famosa série “Succession” da HBO.

Dois exemplos opostos na relação entre irmãos

Como sabemos, a extrema rivalidade entre irmãos pode levar ao completo fracasso da sucessão e ao próprio fim da empresa familiar – e a harmonia ao caso contrário.  Na empresa de venda de bebidas alcoólicas da família Rosen em Chicago, eclodiu um intenso conflito entre dois irmãos que acabou por levar à venda do negócio a terceiros. Mas em oposição um caso em Portugal é particularmente paradigmático – um grupo de irmãos herdou a empresa do Pai e cada um detém ações. Com maior ou menor dedicação diária de cada um à empresa, juntam-se em Conselho todas as semanas numa base de igualdade – escolheram entre si um CEO, mas não há um Presidente acima dos irmãos. A personalidade dos irmãos é naturalmente variada, mas o clima é positivo e as decisões são discutidas e tomadas de forma transparente. E a empresa é líder de mercado, cresce e tem tido uma boa rentabilidade.

Pode a rivalidade ser evitada?

Os motivos que conduzem à rivalidade entre irmãos adultos no contexto da sua empresa familiar são numerosos e a sua gestão pelos restantes elementos da família ou pessoas externas ligadas à empresa nem sempre permite que seja ultrapassada. Nem permite, muitas vezes e conforme o poder dos rivais, salvaguardar a empresa dos efeitos nefastos da batalha dos irmãos.

O segredo do sucesso está na infância e juventude dos irmãos, um tempo durante o qual os Pais estão próximos de cada filho e são capazes de incutir um conjunto de princípios e comportamentos onde a proximidade vai estar sempre acima das divergências entre os irmãos. Exatamente o contrário do que fizeram Logan Roy e a sua mulher em “Succession” – e o que hoje fazem tantos pais, demasiado imersos na empresa ou em atividades sociais para darem aos filhos o tempo e a atenção necessários e estimular neles uma profunda amizade.