Sete deputados eleitos na lista da UNITA solicitaram a suspensão dos seus mandatos para assumirem a função de dirigentes do PRA-JA. O actual Grupo Parlamentar da UNITA é constituído por figuras ligadas ao Bloco Democrático (BD) e ao PRA-JA.

À formalização do partido PRA-JA, em 2023, seguiu-se a edificação das respectivas estruturas internas para assegurar a actividade permanente. Daí o pedido de suspensão dos mandatos. Este caso serve para teorizar sobre a representação parlamentar e problematizar o tema da suspensão de mandatos.

A representação parlamentar angolana assenta na teoria de representação de Kelsen, que se funda em dois princípios vinculativos de um contrato: (i) um acto de fé do eleitor para com o partido; e (ii) um compromisso do deputado em exercer o mandato em nome do partido. Esse contrato pode ser quebrado através de um acto de renúncia do mandato, com consequências gravosas para os deputados, como nunca voltar a ser deputado. O deputado poderá, ainda, pedir a suspensão temporária do mandato.

A suspensão de mandato não serve para um deputado filiar-se noutro partido porque motiva, desde logo, a perda de mandato (art.º 152.º, n.º 2 da Constituição). Sendo uma “consequência natural em toda a parte onde se [pode] votar pelo sistema de lista fechada”. Essa disposição está também presente no ordenamento jurídico português, desde 1975.

Será, assim, difícil ao parlamento angolano aceitar o pedido de suspensão dos mandatos dos sete deputados, por haver uma quebra de confiança entre o eleitor e os seus representantes. Num sistema de lista fechada e bloqueada, como o angolano, de acordo com Kelsen, não existe, em relação ao deputado, um mandato soberano, porque “o seu mandato [existe] apenas ao abrigo da pertença do partido do eleitor”. Por isso, o “acto de votar se reduz sobretudo a uma profissão de fé num determinado partido”.

Face à configuração do mandato, parece-nos equivocada a decisão do Tribunal Constitucional de Angola (TCA) de formalizar o PRA-JA com proponentes que estão a exercer um mandato na lista da UNITA. Esse acto configura, em tese, uma dupla representação política: a) formal-parlamentar na UNITA; e b) material-partidária no PRA-JA. De notar que os militantes do BD tiveram de suspender a militância para constarem na lista da UNITA.

O parlamento angolano deve rejeitar o pedido de suspensão dos sete deputados e reafirmar o espírito subjacente ao mandato parlamentar: o acto de fé e de compromisso. Essa rejeição servirá, em caso de recurso judicial, para o TCA produzir jurisprudência e clarificar o seu posicionamento sobre a dupla representação dos membros do PRA-JA. Ao aceitar a situação do PRA-JA significará, futuramente, que os deputados poderão ser proponentes de novos partidos durante a legislatura.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.