Em 2006 o legislador arrogou-se realizar a reforma da lei do arrendamento que permitisse dinamizar o mercado do arrendamento, preservando os arrendamentos habitacionais em que os arrendatários fruto da idade avançada, de deficiência ou de falta de rendimentos, não tivessem a possibilidade de suportar o aumento das rendas para valores de mercado, bem como tendo a preocupação de salvaguardar com um período transitório o pequeno comércio. Àquela data o legislador elegeu como razões do anquilosamento do mercado do arrendamento, o congelamento do valor das rendas.

Acontece que, de lá para cá, o mercado do arrendamento até se revitalizou, em grande medida não em resultado da reforma legislativa, mas fruto da explosão do turismo, do investimento estrangeiro e da dinamização do comércio e dos serviços nos últimos anos. No entanto, verifica-se hoje um outro fenómeno que coexiste com um número ainda significativo de rendas congeladas, o do incumprimento do dever de pagar as rendas. Com efeito, compreendendo-se a preocupação do legislador com quem não podia à data suportar uma renda nova – sendo certo que a diferença deveria ser suportada pelo Estado e não pelos senhorios –, a mesma benevolência é injustificada relativamente a situações de puro inadimplemento dos inquilinos que, podendo pagar, não o fazem de forma intencional e deliberada, ou que contratam espaços cuja renda sabem que não conseguem suportar, fazendo recair sobre o senhorio a sua falta de seriedade.

Na reforma de 2006, o legislador criou mais um dos balcões administrativos (que tanta aprecia) para resolver, miraculosamente, o problema da morosidade dos despejos nos tribunais. Foi assim criado o Balcão Nacional do Arrendamento, que não é mais que um balcão do despejo, pois só aprecia situações de despejo e, dentro destas, as motivadas por falta de pagamento de rendas. Acontece que, nem o Balcão do Despejo funciona com a celeridade que o legislador prometeu, nem o legislador contribuiu com uma solução legislativa para erradicar o flagelo do incumprimento no pagamento das rendas.

Na realidade, prevendo atualmente a lei que o inquilino possa estar três meses sem pagar a renda para o senhorio poder iniciar os mecanismos com vista ao despejo, estando obrigado a uma comunicação prévia – como se o inquilino não soubesse que está em falta –, para só em seguida poder intentar o despejo no dito balcão, a solução legal é geradora do incumprimento e pactua com a falta de civismo de alguns arrendatários que, uma vez despejados, vão fazer o mesmo para outro lado.

As consequências são a desconfiança dos senhorios relativamente aos arrendatários, a falta de locais disponíveis para arrendar, as rendas altas e a falta de confiança na justiça. O remédio até é simples: permitir ao senhorio o despejo imediato com dois meses de renda em atraso, sem necessidade de comunicações prévias às quais o inquilino se furta e a criação de uma lista negra de inquilinos inadimplentes. Se não for assim, não vamos lá, pois continua a “pagar o arrendatário justo pelo pecador” e as rendas praticadas manter-se-ão em valores muito elevados.