A Universidade do Porto (UP) promove uma Conferência que junta vários negacionistas das alterações climáticas. Entre os oradores da “Basic Science of a Changing Climate”, perfilam-se nomes que defendem, por exemplo, que a Terra é plana.

Se a única vontade expressa por parte desta ‘comunidade de pensadores’ fosse um revivalismo das discussões científicas da Idade Moderna, poderia ter algum interesse – para o estudo da História da Investigação Científica, por exemplo. Não é o caso, nem Galileu nem Copérnico merecem tal afronta. Este encontro, apadrinhado pela Universidade, vem desafiar todos os factos científicos que apontam as causas das alterações climáticas como responsabilidade da nossa espécie.

A notícia gerou espanto e revolta. “Como é possível a Casa da Ciência deixar entrar quem a põe em causa?”, foi uma das reações que mais se fez ouvir. Rapidamente, a instituição invocou o direito a defender-se e afirmou que não fecha a porta a nenhum debate. Ora, não se trata de decidir se a Universidade, ou qualquer uma das suas faculdades, deve ou não aceitar um pedido de cedência de espaço sem escrutinar o propósito de tal organização. Mesmo nesses casos, é responsabilidade de qualquer instituição pública, principalmente do ensino superior, garantir que os discursos proferidos não atentam contra qualquer liberdade.

No comunicado enviado pela UP a toda a comunidade académica, o principal argumento é a defesa da liberdade de opinião. Mais uma vez, não está em causa o conceito fundamental da Constituição e do próprio funcionamento de um Estado democrático. O que provocou a onda de contestação foi o logótipo da Universidade do Porto no cartaz do evento.

Trata-se, sim, de um debate sobre compromissos. Devem as portas da razão estar constantemente abertas para que todos os seus inimigos possam festejar na sua sala de estar? A pretensa neutralidade na posição da UP não existe. A escolha de promover um evento desta natureza implica um posicionamento político implícito. Como prova disso, daremos atenção às declarações de uma das professoras responsáveis pela sua organização: “Não me interessa ter cá alguém a dizer que a causa das alterações climáticas é o CO2, isso não é ciência, é política”.

Rapidamente nos vem à memória uma frase batida: então o que é que não é política? Como afirmei acima, este é um debate sobre compromissos. Não existem lugares vazios nem posições neutrais no debate científico. Quando se abrem as portas a quem desmente, com factos não científicos e através de fake news, as alterações climáticas e as suas causas, está a desautorizar-se a própria legitimidade da Universidade.

É função da Universidade pugnar pela defesa das várias liberdades, entre as quais destaco a liberdade científica e a liberdade de expressão, num sentido amplo. Mas, para que ela possa cumprir essa função social, precisamos de a defender dos aldrabões.