Agora que a Covid abranda, voltamos à vaca fria. Há uma semana Édouard Philipe, ex-primeiro-ministro francês e atual Presidente da Câmara do Havre, alertou para o perigo do défice orçamental e da dívida pública – a companha eleitoral para as presidenciais aproxima-se e as promessas dos candidatos multiplicam-se, todas caras: aumento de 10% dos salários (Valérie Pécresse), cortar para metade os impostos sobre a produção (Xavier Bertrand), reforma aos 60 anos (Le Pen), duplicar o rendimento dos professores (Anne Hidalgo).

Philipe critica os divida-céticos, comparando-os aos clima-céticos: a situação parece manejável hoje, mas a subida da taxa de juro e a exaustão da política monetária torná-la-ão ingovernável. Defende a redução da despesa pública, o que enerva os “macronistas”, malgrado ter declarado o suporte à recandidatura de Macron há uma quinzena. Lembra que em 2007 a França tinha o mesmo rácio de dívida que a Alemanha e que, 15 anos depois, tem 40 pontos de avanço.

Ora, para um país com uma dívida pública de 100% do PIB (e já há muitos) uma subida da taxa de juro de um ponto representa, ao fim de poucos anos (depende da maturidade da dívida) um aumento do défice orçamental de um ponto, só pela via do aumento dos juros. Defende uma regra simples, mas eficaz: que a dívida aumente mais devagar que o PIB.

Mas a taxa de juro vai subir? A evidência parece apontar nesse sentido: a inflação está – para já, paulatinamente – de regresso. Nos EUA, está nos 5,3%, o valor mais alto numa dúzia de anos. O preço da energia, o relançamento da economia e as falhas nas cadeias de fornecimentos são para já os principais fatores explicativos, todos temporários. Mas começa a haver sinais de que há também fatores permanentes a puxarem os preços, coisa que Powell reconheceu a semana passada.

Na antecipação do regresso da inflação e consequente “endurecimento” monetário, as taxas de juro dos títulos do Tesouro estão a subir. A Reserva Federal tem um ponto óbvio por onde começar: cortar os 40 mil milhões de dólares mensais de compras de mortgage-backed securities, que o aquecimento do mercado imobiliário nos EUA (23% de aumento dos preços num ano) torna contraproducentes. É o princípio do fim do quantitative easing, que hoje são 120 mil milhões de dólares mensais de compras de ativos pelo banco central.

Na Europa, o IPC atingiu 3,4% em setembro (era 3% em agosto), o valor mais alto desde 2008, e o Banco Central Europeu compra 80 mil milhões de euros de ativos por mês; mais tarde ou mais cedo terá que começar a trilhar a mesma via.

Neste cenário, controlar a inflação significa que as políticas monetárias ultra-acomodatícias estão em vias de terminar, num horizonte de dois a três anos. E na Europa a situação atual é assimétrica, o que significa que o problema não é igual para todos na União. Tudo isto requer prudência, e reduzir a dívida pública é a primeira medida. Philipe dixit.