Caiu o manto diáfano da fantasia socialista. Só assim se podem interpretar as declarações do líder parlamentar do PS Carlos César e do primeiro-ministro António Costa a propósito da geringonça, na qual os parceiros úteis de legislatura foram despejados num discurso que durou menos tempo que qualquer intervenção política no Parlamento.
Com a nova narrativa socialista, a extrema-esquerda foi posta no seu lugar. O PS, incomodado com os chavões dos seus periclitantes aliados, mostra-se uma Madalena arrependida pronta a lançar amarras a quem estiver disponível para viabilizar os projetos governamentais em nome da estabilidade governativa. Agora. A nova orientação do Governo será de diabolizar a esquerda – esses extremistas que nunca se preocupam com os custos das suas propostas –, ensaiando um novo caminho para captar os votos que precisa para chegar à ambicionada maioria absoluta. Afinal sempre chegou o diabo. Veio foi de outro lado.
Para chegar à maioria o PS precisa dos votos desses mesmos parceiros que agora, enredados nos apoios que foram prestando, sentem o terreno a fugir debaixo dos pés. E bem podem agitar o seu peso político que logo lhes será recordado apoio num momento e contributo para a instabilidade social noutro. Greves e promessas postas em exagero por estes parceiros, irão contribuir para consolidar a imagem de serenidade que António Costa irá por certo reivindicar para si e para o PS.
Desta legislatura fica o regresso de uma despesa pública que se pode tornar incontornável a médio prazo. Como fica provado que o denunciado excesso de cativações foi instrumento de controlo do défice, corresponde à irresponsabilidade de perda de investimento em domínios essenciais para os cidadãos na saúde, nos transportes, na segurança e na manutenção de edifícios públicos. Não foi poupança, foi forretice. À melhor maneira da pior prática dos governos do Estado Novo.
Fica ainda claro e registado que os resultados alcançados só foram possíveis graças ao controlo exigente introduzido pelo governo de Passos Coelho, que arcou com a responsabilidade de endireitar um país à deriva e entregue ao livre arbítrio de terceiros. A vitória nas eleições de 2015 correspondeu ao reconhecimento do esforço de quem reconduziu o país ao patamar da credibilidade perdida com um governo deste mesmo PS.
O Governo atual deixa claro que usou e quer continuar a usar todos partidos na medida da sua ambição e não da sua coerência. Não existe no atual quadro político qualquer justificação para viabilizar as propostas do Governo que os seus parceiros agora recusam. E não faz qualquer sentido para os restantes partidos apoiarem o que andaram a combater uma legislatura inteira e agora serem chamados em missão de urgência para sufragar o que não tem qualquer prioridade. Não é sério por parte do PS. E é injustificável que o PSD e o CDS assumam o papel de bombeiros de um Governo que andou quatro anos a incendiar a política portuguesa.
Temos agora o PS à beira da sobranceria, disposto a distribuir migalhas à espera de receber em troca uma maioria de votos que, a seguir às eleições, lhe permita virar as costas a todos os demais. Aí já não sobranceiro. Apenas altivo, distante e suserano. À espera de tributo.