Não teremos um novo Orçamento do Estado no dia 1 de janeiro de 2022.

O que é que isto significa? Significa que o orçamento de 2021 continua em vigor e o Governo terá de viver de duodécimos, ou seja, em cada mês, só pode gastar até 1/12 da despesa executada no ano anterior, mesmo que consiga angariar mais receita. E chamo a atenção que é da despesa executada e não orçamentada.

O funcionamento em duodécimos é particularmente problemático no que diz respeito ao investimento público (IP), já que, tradicionalmente, a sua execução fica abaixo do orçamento.

A execução média do IP entre 2015 e 2020 foi de 85,1%, apesar de em 2020 ter sido excecionalmente alta – 90%. E na proposta de Orçamento do Estado (OE) do Governo para 2022 prevê-se um aumento de cerca de 32% acima do executado em 2021. Por isso, nesta rubrica, o funcionamento em duodécimos pode ter um impacto muito significativo.

Em relação ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), no entanto, a situação pode não ser tão dramática, já que apenas ficará em causa a parte da comparticipação nacional.

Como a maioria dos projetos do PRR são plurianuais, poderá haver lugar a algum adiamento dessa comparticipação sem pôr em causa os projetos. Claro que se a situação se prolongar estas negociações ficam, inevitavelmente, mais complicadas.

Há ainda um conjunto de medidas de apoio às empresas e famílias que ficam necessariamente em “standby”. Para além do limite de 1/12 do executado, medidas específicas que estejam previstas na lei do OE de 2022 não poderão avançar, uma vez que a lei que as regula não está aprovada.

Neste sentido, por exemplo, o aumento de 0,9% para os funcionários públicos ou o descongelamento de carreiras tornar-se-ão praticamente impossíveis de concretizar (embora pudessem ser pagos mais à frente no ano, como retroativos). Também será praticamente impossível o aumento extraordinário de pensões. O aumento de escalões de IRS, que poderiam ter um impacto positivo em alguns agregados familiares, também não será concretizado.

Da mesma forma as medidas de apoio às empresas como, por exemplo, o Incentivo Extraordinário à Normalização ou o programa ativar.pt, se implicarem um aumento de despesa superior ao teto referido, terão de ser adiadas.

É de relembrar que o OE de 2021 foi, apesar de tudo um orçamento com alguma folga na despesa por força da pandemia, pelo que os duodécimos não serão excessivamente apertados. E como a receita pode aumentar, o que acontecerá com a recuperação do mercado de trabalho, por exemplo, esta situação será vantajosa do ponto de vista do deficit.

Mas sem ilusões: é mau do ponto de vista da utilização da principal ferramenta de políticas públicas, retira margem de manobra para se começar a conduzir a economia num determinado sentido e a implementar uma estratégia de recuperação equilibrada, e adia algumas decisões, podendo chegar a inviabilizar outras!

Ou seja, dois ou três meses em duodécimos não é o fim do mundo, mais do que isso pode efetivamente pôr em perigo a trajetória de recuperação prevista para 2022.