No seu discurso de estreia, que acontece três meses depois de tomar posse como procurador-geral da República, Amadeu Guerra criticou a falta de magistrados e de oficiais de justiça. Sobre a autonomia financeira deixou um recado ao Governo, referindo que a PGR não obteve “ganhos significativos ao nível das tecnologias e sistemas de informação” através dos Fundos Comunitários.
“As verbas disponíveis foram concentradas, tanto quanto se sabe, no IGFEJ e na DGAJ” e, por isso, esclareceu Amadeu Guerra, a PGR depende “da boa vontade dessas entidades”, tuteladas pelo Ministério da Justiça. Uma autonomia financeira permitiria, por isso, ao Ministério Público fazer “uma gestão mais rigorosa das verbas a atribuir e apostar, de forma integrada, em ferramentas mais rentáveis no domínio da informatização, tratamento da informação e digitalização”, acrescentou.
A terminar o seu discurso, fez ainda referência à estratégia de recuperação de ativos, já elaborada e disponível e que pretende “assegurar que é criada uma efetiva cultura de recuperação dos ativos para a criminalidade económico-financeira em Portugal”.
A cerimónia oficial da abertura do novo ano judicial decorreu no Salão Nobre do Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, e discursam também, além de Amadeu Guerra, a bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro, a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, juiz conselheiro João Cura Mariano, o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Já a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, defendeu que a reforma do setor não se faz de “grandiosos ‘planos estratégicos’” mas sim resolvendo os problemas “um a um” e declarou-se “uma aliada” dos funcionários judiciais, hoje novamente em protesto.
“Eu sei o que fazer para que a Reforma da Justiça não tenha resultados: é fazer anúncios de grandiosos ‘planos estratégicos’. E também sei o que fazer para que Justiça seja reformada: resolver os problemas um a um, mesmo que não sejam imediatamente percetíveis para o cidadão”, disse a ministra.
No mesmo sentido, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o juiz conselheiro presidente João Cura Mariano, sublinhou a necessidade de uma “extensa reforma” da justiça, pediu alterações à lei que facilitem a entrada de novos magistrados e criticou a demora legislativa do parlamento para travar o envelhecimento de juízes.
Cura Mariano propôs ainda que os alunos universitários com notas mais elevadas nas licenciaturas e mestrados possam ser dispensados dos exames escritos requeridos no acesso à magistratura, mantendo-se a obrigatoriedade de provas orais. E defendeu também uma “minúscula alteração” ao Estatuto dos Magistrados Judiciais para inverter o ciclo de envelhecimento de quadros no STJ: “Ainda não entrou sequer no parlamento qualquer iniciativa legislativa, sem que eu consiga descortinar uma explicação para tal atraso, face à gravidade da situação”.
A bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro, alertou ainda que a Ordem dos Advogados tem alguns desafios internos que “urge resolver”. “E pese embora nos custe, ano após ano, exigir as mesmas mudanças, não nos cansaremos de o fazer até que os poderes políticos respondam de forma a garantir quer um tratamento digno no sistema de acesso ao direito e aos tribunais, quer uma previdência digna desse nome aos nossos e nossas associadas”, disse.
Fernanda de Almeida Pinheiro criticou também a portaria de alteração do SADT, afirmando que este serviço público garantido pela advocacia sempre funcionou, desde a sua criação até à presente data. “Não sabemos se podemos dizer o mesmo de qualquer outro serviço público, ainda para mais se recordamos que os honorários pagos aos profissionais que garantem o sistema, não são atualizados há 20 anos, dois meses e umas quantas horas”.
Convergência entre atores
José Pedro Aguiar-Branco, anunciou que vai reunir em fevereiro, no parlamento, os diferentes agentes do sistema judicial para encontrar pontos de convergência sobre dez medidas base que lancem “uma revolução cultural” no setor. “Se o problema é dar o primeiro passo” para uma reforma da justiça, “permitam-me que seja eu a fazê-lo”, declarou no discurso que proferiu na sessão solene de abertura do ano judicial e que antecedeu o do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
No mesmo sentido, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pediu convergência entre atores políticos e judiciários para mudanças na justiça, considerando que se vive um novo ciclo, com novas lideranças, que constitui uma oportunidade única. O Presidente destacou duas possibilidades, “a ambição de um pacto de justiça”, como propôs no início do seu primeiro mandato, ou “de passos mais pequenos e por áreas de maior urgência de intervenção”.
No fim da sua intervenção, o Presidente da República afirmou que “o tempo foge e convida a que a Assembleia da República, Governo e protagonistas judiciários não desperdicem esse tempo” e defendeu que se trata de um “imperativo nacional” e até de “uma exigência nacional”.
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