A caminharmos velozmente para uma recessão económica sem precedentes, abriu a época das contratações e transferências. A mais polémica de todas, o retorno da apresentadora de televisão Cristina Ferreira da SIC para a sua antiga casa, a TVI, lançou a discussão sobre o apoio do Governo aos órgãos de comunicação social no valor de 15 milhões de euros em abril passado.

Antes de mais, convém esclarecer que não foi um apoio mas a compra antecipada de espaços de publicidade institucional orientados para campanhas da Direção-Geral da Saúde e outras instituições de saúde pública, causas sociais, humanitárias e programação cultural. A medida levantou muitas questões na altura: os critérios aplicados pelo Governo na atribuição do montante; a decisão da transferência desse valor para as empresas de comunicação social não ocorrendo o mesmo noutros sectores, inclusive em empresas na área da saúde em plena epidemia; a aprovação da medida pelo Conselho de Ministros e não pelo Parlamento, numa verba três vezes superior ao que estava previsto no Orçamento do Estado para 2020, entre outras.

Apesar da contestação, a medida avançou. Uma das empresas contempladas foi a TVI, no valor de três milhões de euros. Exatamente o valor que irá despender para a apresentadora da SIC regressar ao canal de televisão. A polémica estalou com acusações da contratação ser efectuada com o dinheiro dos contribuintes. Até o líder da oposição, Rui Rio, não se coibiu de desferir críticas esquecendo-se que tanto a TVI como a SIC são empresas privadas com direito a tomarem as suas decisões negociais de estratégia em relação às suas contratações e obliterando na sua comunicação o facto de a SIC poder vir a receber uma indemnização de quatro milhões de euros pela quebra de contrato.

Não foi o único a embarcar neste linchamento público sem sustentação, mas sendo o líder da oposição torna-se emblemático do desnorteio do PSD numa altura em que o país mais precisa de uma oposição consciente e forte.

Vamos ser claros, não concordar com a medida do Governo e a forma como a executou, até porque simultaneamente o executivo não avançou com as propostas a nível fiscal apresentadas pela comunicação social como a isenção de IVA nas assinaturas e vendas em banca, essas sim, medidas eficazes no combate à crise no sector e proveitosas às empresas e aos leitores, é legítimo. Criticar e levantar questões sobre a forma como as empresas privadas gerem o seu capital é absurdo.

Na senda do linchamento popular, a outra vítima foi a apresentadora. Cristina Ferreira chateia muitas pessoas. Não trocou apenas a SIC pela TVI, passa a deter uma participação no capital social da empresa, e essa é que é a verdadeira notícia.

É de uma nova geração onde se inclui o Cristiano Ronaldo e outros que vieram de um meio humilde, sem nome de família, sem cunhas, sem negociatas e corrupção, que subiram a pulso nas suas áreas, com muito trabalho e dedicação. E isso chateia muitos num país que não está habituado ao mérito ou que não sejam sempre os mesmos a vencer. É absurdo que as decisões profissionais de uma cidadã que não cometeu nenhuma ilegalidade se tornem uma pedra de arremesso da oposição.