Com os últimos números de outubro, referentes à inflação, de uma coisa estamos agora cientes: acabou a era da inflação baixa.

Não deixa de ser arrepiante o discurso de alguns banqueiros centrais, sobre o alegado caráter temporário deste disparar dos valores da inflação. Eles, que inundaram o mundo com dinheiro grátis, substituindo-se na tomada de decisões aos políticos eleitos, conscientes que estavam dos efeitos de suas ações sobre o emprego, investimento, aforro, estabilidade do setor financeiro, curiosamente parecem agora ter sido apanhados de surpresa pelas suas ações.

Os mercados das obrigações, livres de restrições políticas ou de efeitos de halo das decisões dos banqueiros centrais, têm sido razoavelmente assertivos: acreditam que nos próximos anos as metas de inflação dos bancos centrais serão ultrapassadas, ainda que sem uma perda total de controlo.

Mostram também que acreditam que a economia alemã, após uma década de deflação, entrou num ciclo de inflação alta. E que tal padrão poderá ser o novo normal das restantes economias da União Europeia. E isto explica o motivo pelo qual em sede de concertação social, na mesma nação locomotiva da Europa, se discutem aumentos das cláusulas de expressão pecuniária do trabalho na ordem dos 5%. Sim, caro leitor, leu bem.

Os dados de outubro mostram ainda que as pressões inflacionistas, até ao início do verão muito associadas ao reabrir da economia, agora se espalharam por um leque alargado de setores, de categorias de produtos e de alguns serviços. Já não estamos apenas no domínio da reabertura da economia ou de meros efeitos da base de cálculo.

Acresce que o recente recrudescimento da pandemia continuará a colocar pressão nos preços dos bens, agravando mais ainda os problemas das cadeias de abastecimento locais.

Do que acima se refere decorre que esta realidade inflacionária será tanto mais sentida por todos aqueles que tiverem que se deslocar por meios próprios para trabalhar, precisem de fazer obras em casa ou sofram de um inverno frio com a necessidade de aquecerem as suas residências e os seus locais de trabalho.

Por tudo isto, prestam um mau serviço aqueles que querem fazer acreditar à opinião pública, às famílias, aos aforradores e aos trabalhadores, que a inflação (e a perda de poder de compra) é temporária. Sejamos muito claros. Está em curso uma imensa redistribuição de rendimento pela calada, à boleia desta inflação.