Há algumas semanas analisava neste espaço o impacto que a transformação digital está a ter nos hábitos sociais e profissionais não só das novas gerações millennials, que são as que têm concentrado a atenção dos especialistas, mas também das pessoas com mais idade, os “velhennials”. O impacto deste processo de transformação é profundo e não se limita às pontas da pirâmide etária, embora afete de forma diversa cada uma das gerações que convivem na atualidade.

Neste sentido, há uns meses fiquei surpreendido por uma situação que aconteceu no processo de implantação de um novo sistema de informação na nossa fábrica. Este sistema altera os processos de registo de atividade nos computadores das máquinas de produção e, no âmbito de uma sessão de formação, foi referida a necessidade de carregar no botão direito do rato para aceder a um determinado comando.

Nessa altura, um dos chefes de turno, que considero bastante competente e a caminho dos 30 anos de idade, levantou a mão para interpelar o apresentador com a seguinte questão: “O que é um rato?” Embora essa questão possa parecer surpreendente às pessoas da minha geração, a verdade é que uma grande parte da experiência digital das pessoas com essa idade tem acontecido através dos écrans tácteis de telefones e tablets e não de computadores de secretária.

Mas as mudanças sociológicas dos jovens adultos não se limitam aos efeitos da evolução tecnológica. Cada vez há mais adultos na casa dos 40 anos apaixonados pela banda desenhada, manga ou anime. São os herdeiros da cultura pop, criados com heróis de plástico, os mais velhos, e digitais, os mais novos, além de videojogos e de canais infantis especializados.

Trata-se das primeiras gerações que viveram plenamente a adolescência, conceito nascido após a Segunda Guerra Mundial para referir a descorrelação temporal entre um desenvolvimento físico acelerado dos jovens, decorrente do maior bem-estar, e a menor maturidade emocional pelo adiamento da independência dos progenitores.

Estas gerações acumulam longos anos de estudo e poucos anos de trabalho, sobretudo naquelas áreas que escolheram para desenvolver a profissão de eleição. Como consequência disso, dependem economicamente das suas famílias e acabam por perpetuar um estilo de vida adolescente.

Estes adultos enfrentam uma enorme incerteza sobre o futuro e encontram na adolescência o único património vital comum e estável. São alvos fáceis das marcas que revivem essa época e fomentam a infantilização de um consumidor que se procura abstrair da precaridade laboral e que, apesar dessa situação, sempre terá maior capacidade de compra que os adolescentes “reais”.

Este espírito de infância contínua tem-se trasladado às novas empresas tecnológicas, em que os cartões de visita anunciam cargos como “super-herói de atendimento” nos centros de chamadas; “vice-rei galático” para um responsável de desenvolvimento de software; ou “águia poderosa” para o CEO, neste caso da Rovio, a empresa finlandesa que desenvolveu os “Angry Birds”. Caricaturas ou exemplos de uma nova cultura?