Pandemia, coronavírus, Zoom, Teams, Meet, “achatar a curva”, “distanciamento social” são alguns dos vocábulos e expressões que entraram subitamente no nosso quotidiano, marcado pela “disrupção”. “Incerteza” é porventura a palavra que com mais rigor carateriza o tempo que vivemos. Também “digitalização”. Seguir-se-á “recessão” e “desemprego”. Mas também “reinvenção”.

Camões escreveu (e José Mário Branco cantou) que “todo o mundo é composto de mudança”, mas não viveu num tempo de aceleração da história, de transformação tecnológica, de transição geopolítica e de polarização social.

No mundo das advocacias, como em tantos outros, a Covid-19 obrigou a uma mudança instantânea para um modelo de trabalho remoto que, surpreendentemente para alguns, funcionou de forma suave e sem ruturas. Foram canceladas muitas viagens (que hoje percebemos seriam) desnecessárias, reuniões presenciais passaram a videoconferências. Claro que nas organizações mais preparadas tecnologicamente a transição foi rápida, suave e sem sobressaltos, facilitada pelo acesso remoto e seguro ao arsenal de informação e automação disponível e a boas ferramentas e plataformas de comunicação com os clientes. O funcionamento dos tribunais, em contrapartida, foi largamente afetado, em grande medida por falta de investimento em tecnologia e formação.

Muitos se interrogam sobre qual a receita para um “novo normal”, ou para uma versão 2.0 do modo de vida das advocacias. Não penso que haja receitas. Mas há alguns ensinamentos que vieram a revelar-se ou a confirmar-se nestes tempos:

1. O futuro é sempre imprevisível;
2. A cada momento surgem novas mentalidades, novas necessidades dos clientes, novas exigências de “mais por menos”;
3. O desenvolvimento tecnológico coloca ao dispor do mercado da advocacia novas ferramentas (IA, automação, blockchain) e novos processos na prestação de serviços;
4. Cada vez mais, novos players vão oferecer “produtos” em lugar de “serviços”, colocando desafios regulatórios e de concorrência;
5. Novos advogados procuram experiências e não carreiras;
6. A sustentabilidade passou a ser uma condição e não um ornamento;
7. Ao lado do conhecimento técnico, são cruciais os skills sociais, tecnológicos e de negócio;
8. A agilidade e a transparência na tomada de decisão e a capacidade de reação perante o imprevisto são fundamentais;
9. Os advogados híbridos (com formação ou experiência em direito e outras áreas, da tecnologia às finanças, da arquitetura à economia) trazem mais-valias importantes;
10. A valorização de profissionais não advogados no mundo da advocacia e a colaboração quotidiana entre estes e advogados veio para ficar;
11. O trabalho remoto – que não era desconhecido antes da pandemia, claro – veio inserir-se, ainda que em grau imprevisível, no futuro da advocacia.

Dos onze pontos que indico, o mais importante é o primeiro. Talvez não haja um futuro mas muitos, tal o ritmo das mudanças que a nossa vida vai continuar a enfrentar. Daí que seja irrealista pensar que algum dia chegaremos a um momento de estabilidade chamado “novo normal”.