O folhetim em torno da CGD não nos deve desviar da questão essencial: a estabilização do sistema financeiro português, objetivo que, dez anos decorridos desde a crise desencadeada pelo subprime, continua por alcançar. Neste período, o crédito malparado atingiu máximos históricos, fragilizando o balanço dos bancos. O montante total do crédito vencido mais do que duplicou entre o final de 2010 e o início de 2016, subindo de 8.695 para 17.708 milhões de euros. Calcula-se que o crédito malparado corresponda a 8,84% do crédito total.
Para ser dinâmica, a nossa economia necessita de um sistema financeiro estável, credível e com liquidez. Ora, apesar do músculo financeiro que BCP e BPI ganharam recentemente (aumento de capital, no primeiro caso, e OPA do CaixaBank, no segundo), permanecem muitas dúvidas em relação ao funcionamento da CGD – ainda que o processo de recapitalização esteja aprovado pela EU – e o futuro do Novo Banco é ainda uma incógnita.
O crescimento do crédito malparado e a instabilidade do setor bancário colocam sérios entraves ao financiamento às empresas. Por outro lado, estando a banca maioritariamente nas mãos de acionistas estrangeiros, corremos o risco dos interesses empresariais portugueses não serem devidamente atendidos. Isto numa altura em que Portugal não pode sofrer uma nova quebra no investimento, sob pena de se comprometer o crescimento económico para os próximos anos.
Importa, pois, encontrar uma solução eficaz e duradoura para os problemas da banca, passe ela ou não pela criação de um “banco mau”. Embora a ideia do “banco mau” apresente riscos, o maior dos quais é poder ter custos para os contribuintes que devem ser protegidos, até pela história recente do grande impacto que teve o BPN, não me parece, de princípio e com as devidas salvaguardas, que deva ser descartada. Devemos acima de tudo ter pensamento estratégico que crie as devidas condições para que os bancos tenham capacidade para financiar devidamente as empresas e a economia, em busca do crescimento de que tanto necessita o país.
Parece-me ainda que, no processo de venda do Novo Banco, o Governo tem de acautelar os interesses do tecido empresarial. O antigo BES é talvez a instituição que mais crédito concede às PME, pelo que se afigura da maior importância garantir que este apoio não se perde com a provável venda do banco ao fundo Lone Star. É fundamental que a aquisição do Novo Banco não seja um negócio de ocasião, mas sim o início de um projeto financeiro sólido e amigo das empresas. Mesmo que, para isso, o Estado tenha de manter uma posição acionista no Novo Banco, tal como fez com a TAP.
Também me parece essencial ao futuro da nossa economia que a nova administração da CGD assuma uma estratégia mais virada para o financiamento às empresas, sobretudo dos setores exportadores. Ao invés de financiar projetos de grande escala e nem sempre realistas, como aconteceu no passado, a CGD deve apoiar PME da economia produtiva, com bens transacionáveis e capacidade de exportação. É isto que, no atual contexto económico, se espera de um banco público.
Muito do crédito malparado é da responsabilidade das sociedades não-financeiras, o que entronca com o problema do sobreendividamento das empresas privadas (144,9% do PIB, em 2015). Também nesta questão há que encontrar soluções inovadoras, de forma a reestruturar as dívidas das empresas sem penalizar os bancos e os contribuintes. O Programa Revitalizar procura preservar empresas com viabilidade, mas os seus resultados estão aquém das expectativas. Há então que reformular o Programa Revitalizar, considerando, por exemplo, que muitos dos planos de recuperação de empresas são chumbados pelo próprio Estado, através da Autoridade Tributária.