No último artigo de opinião, escrevi sobre o Facebook e a crise de confiança que está a viver. Referi os resultados da edição de 2018 do Edelman Trust Barometer onde, pela primeira vez, os media foram a instituição menos confiável a nível global, em 22 dos 28 países inquiridos. Uma diminuição da confiança no “quarto poder”, que tem ligação direta a uma quebra de confiança nas plataformas, sobretudo search engines e redes sociais, onde 63% dos inquiridos afirmam não conseguir distinguir o bom jornalismo de um rumor ou fake news, ou ainda se o artigo foi produzido por um organismo de comunicação social credível.

Depois das últimas notícias, impõe-se dar continuidade ao tema, mas com novas questões. A primeira é: onde irão confiar os gigantes que vão deixar de investir milhões em publicidade digital?

A Unilever, o segundo maior anunciante do mundo a seguir à concorrente Procter&Gamble, assumiu publicamente que está a ponderar deixar de anunciar em plataformas digitais como o Google e o Facebook, os dois maiores suportes publicitários a nível mundial.

A intenção foi anunciada por Keith Weed, administrador de marketing da Unilever, durante a conferência anual do Interactive Advertising Bureau, em Palm Desert, Califórnia, que reúne anunciantes, grupos de media e empresas tecnológicas. Weed explicou que “a Unilever não pode ter um ambiente em que os seus consumidores não confiam naquilo que veem online” e quer garantias de que os anúncios de marcas como Dove, Lipton ou Ben & Jerry’s são vistos por pessoas reais, que as suas visualizações não são manipuladas, e os dados e métricas auditados por entidades independentes – algo que não acontece nos dois gigantes que concentram 60 por cento da publicidade digital mundial. Recorde-se que o orçamento global de marketing da Unilever é de oito mil milhões de euros, dos quais dois mil milhões vão para o digital.

Uma segunda questão é: o que vão fazer os jornais? Além dos anunciantes, os jornais, que se apaixonaram pelo Facebook na última década, vêm agora declarar publicamente o divórcio litigioso e doloroso. Amargurados, e com o sofrimento de quem tem passado por grandes provações nos últimos tempos, dizem claramente “basta!”.

O primeiro foi o Folha de São Paulo, o maior jornal do Brasil, com uma circulação de 300 mil exemplares diários e mais de 8 milhões de seguidores na rede social de Mark Zuckerberg. Ao El País, o diretor da Folha de São Paulo esclarece que “a Folha acha que conteúdo de qualidade tem de ser remunerado” e que “o Facebook parece não levar em conta nada disso”. Ficou aberta a discussão que tem gerado polémica nos meios de todo o mundo.

A par de tudo isto e o pior de tudo isto, é que alguns executivos, gestores e funcionários do Facebook e da Google saíram das empresas e criaram o “Centro de Tecnologia Humana”, um grupo que promete fazer pressão a nível jurídico para restringir o poder das grandes empresas tecnológicas e que quer criar um site para orientar especialistas da área e ir às escolas. Um grupo do qual faz parte o criador do famoso Like do Facebook, Justin Rosenstein, Sandy Parakilas, ex-gestor de operações do Facebook,  Lynn Fox, ex-executivo de comunicações da Apple e da Google e Dave Morin, ex-executivo do Facebook. Será que os feiticeiros se viraram contra o feitiço que ajudaram a criar? Eles sabem tudo sobre estas empresas.

A verdade é que se criou uma aliança nunca antes vista, que integra nomes importantes que saíram de Silicon Valley, e que vai abanar o que até agora ninguém imaginava poder ser abalado. A campanha “The Truth About Tech” vai percorrer 55 mil escolas públicas dos Estados Unidos para alertar para os perigos da tecnologia. O site que o grupo quer criar vai disponibilizar informações sobre o impacto de diversas tecnologias na saúde mental e formas de tornar os produtos menos perigosos. O que isto vai dar ninguém sabe, mas está seguramente a nascer uma nova era de Silicon Valley para o mundo, contra um dos seus maiores sucessos nas últimas décadas.