Lara, uma jovem minha conhecida nascida e criada na Sibéria russa (o nome é fictício), é de um cosmopolitismo e conhecimento da cultura ocidental que faz corar de vergonha muitíssimos portugueses. Vive em Portugal há vários meses e disse-me ontem que o aspeto de que mais gosta de Portugal é a democracia. É para ela uma extraordinária e agradável experiência os portugueses poderem exprimir, debater, manifestar as suas ideias e filiações políticas, fazer greves e reivindicar com liberdade, sem o terror de serem de imediato detidos.

Resumindo a sua experiência portuguesa, disse: “democracy is cool”, a democracia é fixe. Esta atração pela democracia desde sempre enfurece ditadores, como Putin, e protoditadores, como Trump. Em agosto, Trump disse que iria prender os seus inimigos políticos se fosse eleito para a Casa Branca. Em setembro ameaçou de morte o General Mark Milley. E as ameaças às liberdades democráticas e ao Estado de direito têm-se sucedido.

Relembro Churchill quando, há 66 anos esta semana, 11 de novembro de 1947, disse depois da derrota de Hitler, perante a ameaça de Estaline, e apesar da sua própria estrondosa derrota eleitoral em 1945: “Muitas formas de governo foram testadas e serão testadas neste mundo de pecado e miséria. Ninguém finge que a democracia é perfeita ou omnisciente. Na verdade, tem sido dito que a democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras formas que foram tentadas de tempos em tempos.”

Comparando com outros países europeus que conhece, Lara também considera que o ordenamento constitucional e a prática política em Portugal é, em vários aspetos, designadamente os que se prendem com a liberdade de expressão, mais livre e transparente que o de outros países, em particular os de Leste. A rematar confessou que gosta de Portugal, que os portugueses são muito melhores do que aquilo que pensam e dizem de si mesmos e do seu país. Por exemplo, maravilhou-se por ter recebido o cartão de residente em apenas dois meses e não nos três que lhe tinham prometido.

Esta é a opinião de alguém que está mergulhada no funcionamento de uma democracia pela primeira vez, e que também reflete a atração dos estrangeiros que vivem o que Portugal tem de bom sem ter de suportar os baixos salários, os elevados impostos, as taxas, o IUC dos carros mais antigos, etc..

Aquele país em que a classe média está a ser paulatinamente destruída, em que dois esteios da sociedade – médicos e professores – estão a ser castigados pela sua dedicação à causa pública, em que os jovens qualificados fogem para os lugares de onde vêm esses estrangeiros encantados com o Portugal da fotografia (patrocinada com o dinheiro dos contribuintes, ver revista de “Le Figaro” hors-série desta semana), onde os mais velhos se angustiam com a ideia de que qualquer sobressalto político (as palavras mudança e reformas são malditas para esses cidadãos) possa pôr em causa a perda de valor da sua pensão, por insignificante que seja.

Os portugueses não podem ser complacentes. E têm sido mansos, na palavra do jornalista e comentador José Manuel Fernandes. Há muito que melhorar, desde logo transportar para a prática política muitas das ideias e opiniões expressas no debate político. Não basta falar. É preciso com urgência fazer o que se predica. O objetivo número um é melhorar a vida real de milhões de portugueses. A degradação económica está a conduzir muitos portugueses para a extrema-direita e para a eventual perda de liberdades, perspetiva imaginada ou real que também assusta Lara. Esse bem supremo que a encanta, a democracia, poderia perder-se.

É preciso convencer uma parte importante dos eleitores que há políticos portugueses com as qualidades e experiência para praticar as medidas que assegurem um presente e um futuro melhor a velhos e novos, com outra política, mais eficiente, mais competente, mais inteligente do que aquela em que vivemos há oito anos. Repare-se que a palavra estupidez é cada vez mais usada no discurso público para designar decisões políticas da maioria absoluta que nos governa.

O papel-chave na adoção de políticas pró-desenvolvimento económico, social, cultural que favoreçam a criação e distribuição de riqueza pela iniciativa privada – a única saída possível para a estrada cada vez mais estreita que percorremos – cabe, ainda, ao PSD.

Por várias vezes escrevi neste jornal, em anos recentes, que o PSD tem de construir uma alternativa política, de raiz social-democrata, com a Iniciativa Liberal e o CDS, que se apresente ao eleitorado como realista, viável, competente, eficiente. Tem de ficar claro: a alternativa PSD-IL-CDS não quer reformar nem mudar a sagrada democracia, nem as liberdades, nem a segurança do Estado social.

Pelo contrário, quer melhorar e assegurar que o que temos no presente só estará assegurado no futuro estabelecendo uma aliança para o desenvolvimento económico com os únicos agentes económicos capazes de criar e gerar riqueza, e garantir o Estado social e democrático que a maioria dos portugueses deseja: os empreendedores, os criadores de empresas e postos de trabalho, os detentores de meios financeiros ou com acesso a eles através do mercado de capitais.

Essas pessoas e organizações são pagadores de impostos e contribuições para a segurança social e se os negócios forem prósperos, mais pagarão, mais postos de trabalho criarão e, expectavelmente, serão geradores de lucros para recompensar o seu esforço, risco, incerteza, investimento, e para reinvestir em conhecimento e expansão dos negócios, acrescentando sucessivamente valor com permanente inovação.

Esse é o Portugal que eu gostaria de ver. É preciso que o PSD assuma a sua responsabilidade para com a democracia que ajudou a construir e avance já, com urgência, determinação, firmeza estratégica e confiança, para a criação dessa aliança por um Portugal melhor.