A Altice Portugal denunciou junto do Governo a proposta da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) de alteração às regras do leilão do 5G, que prevê a inibição da utilização dos incrementos mais baixos de 1% e 3% numa corrida cuja fase principal dura há mais de 150 dias, apurou o Jornal Económico (JE). A Altice já tinha ameaçado avançar mais uma vez para tribunal para tentar travar novas alterações ao regulamento do leilão.
A Anacom iniciou um segundo processo de alteração do regulamento do leilão do 5G a 12 de agosto, para precipitar a conclusão da corrida, dois meses depois de ter decidido aumentar as rondas de licitação diárias de seis para doze. O regulador decidiu avançar com esta alteração porque a primeira mudança “não tem sido suficiente para impactar na resolução do muito reduzido nível de excesso de procura existente, não tento assim, a realização de 12 rondas diárias alcançado a pretendida celeridade ao leilão”.
“A proposta de alteração agora anunciada pela Anacom é manifestamente ilegal e, se aprovada, irá criar ainda mais perturbação num processo estratégico e fundamental para o futuro do país, mas que, desde o início, está inquinado por força das opções erradas adotadas pela entidade reguladora”, lê-se na carta enviada para os ministros da Economia, Pedro Siza Vieira, e das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, a que o JE teve acesso.
A mesma missiva, com data de 23 de agosto, também foi enviada para o secretário de Estado Adjunto e das Comunicações, Hugo Santos Mendes, e para o secretário de Estado para a Transição Digital, André Aragão de Azevedo.
A Altice refere que o regulador já tinha ponderado em abril com a inibição de incrementos de 1% e 3%, mas que optou por não implementar a medida, provavelmente – sublinha a dona da Meo -, por “não ter obtido um parecer jurídico que apoiasse essa medida”.
A telecom estranha, agora, a decisão da Anacom e reitera junto dos governantes que “recusa integralmente a alteração que a Anacom se propõe a introduzir no regulamento 5G”.
A empresa liderada por Alexandre Fonseca defende-se, ainda, da acusação da Anacom, de que seriam os operadores, pela forma como se propõem a adquirir as licenças das novas faixas, os responsáveis pela demora na conclusão do leilão do 5G.
Para a Altice, a responsabilidade do atraso do 5G é do regulador, liderado por João Cadete de Matos, porque “criou uma escassez artificial no acesso ao espetro radioelétrico na faixa dos 3,6Ghz [gigahertz]”, por não ter ter revogado o direito de utilização naquela faixa “quando tinha todas as condições para o fazer”. Mas também porque decidiu não introduzir no regulamento do leilão “os mecanismos que lhe permitissem acelerar o procedimento do leilão (como os que pretende introduzir agora), quando já era evidente o risco de a licitação na faixa dos 3,6 GHz se poder prolongar por muito tempo”.
“[A Anacom] decidiu não submeter o projeto de regulamento do leilão ao processo de revisão interpares do RSPG, apesar de a Altice ter alertado no devido tempo para essa necessidade, o que, a ter sido feito, teria evitado os erros crassos do regulamento”, faz notar também a Altice ao Governo.
Altice reitera que regulamento já permite acelerar corrida e revela falha na plataforma do leilão
Anexada à missiva, a telecom fez chegar ao Executivo a pronúncia que enviou à Anacom sobre a nova alteração proposta, a 19 de agosto. Nela, lê-se que o operador “não vê motivos para que a Anacom venha agora – vários meses depois de se ter iniciado a fase de licitação principal, mas apenas um mês e meio depois de promovida a primeira alteração ao regulamento – voltar a modificar estas regras, e logo de forma tão radical”.
Para a Altice, trata-se de mais um episódio que “evidencia o que tem sido o comportamento errático da Anacom” na gestão do dossiê do 5G.
Na pronúncia enviada ao regulador, anexada à carta enviada aos governantes, o operador rejeita o pretexto da “urgência” que a Anacom pretende “impor” à proposta de alteração. A Altice refere que as regras atuais já permitem “a adoção de algumas medidas para impor maior celeridade ao leilão 5G, embora o regulador “nunca logrou utilizar, preferindo enveredar por alterações às regras do jogo”.
De acordo com a Altice, a versão atual do regulamento, no seu artigo 27, já prevê que a Anacom possa terminar uma ronda “no momento em que forem submetidas as licitações por todos os licitantes, dispensando-a de aguardar pelo total da ronda (uma hora)”.
Acresce, contudo, que a plataforma onde são submetidas as propostas dos operadores não permite “que os licitantes, quando já tiverem as melhores ofertas nos lotes que pretendem, declarem que não pretendem licitar mais nessa ronda”. Tal, segundo a Altice aponta na pronúncia, impede o regulador de antecipar o fecho da ronda. Uma questão que o operador reclama que teria sido “simples de corrigir”.
Outro argumento é que “o valor substancial que os lotes da categoria J (a única na qual ainda existe excesso de procura) já atingiram, e que se encontra, neste momento, já muito próximo do valor médio europeu”, pelo que o risco de prolongamento excessivo do leilão, que serve para “justificar as alterações que [o regulador] pretende introduzir no regulamento, é mínimo”.
“A conclusão da fase principal de licitação pode ocorrer a qualquer momento”, aposta o operador.
Outra critica que consta na pronúncia respeita à “desproporcionalidade e injustificação de uma nova mexida nas regras, o que, para a Altice, coloca “em sério risco meses e meses de planeamento estratégico e de investimento que os licitantes foram já colocando no leilão 5G”.
“A Altice Portugal já decidiu deixar de licitar num ou noutro lote em que tinha interesse, não podendo agora voltar a licitar”, por força das circunstâncias, lê-se. Caso pudesse ter antecipado que as regras poderiam vir a ser alteradas, o operador assegura que teria adotado uma “estratégia distinta” e tomado “decisões diferentes”. Mas – critica a dona da Meo – “um pressuposto (o da flexibilidade das regras) não foi dado a conhecer anteriormente” e, por isso, não foi levado em linha de conta na definição da estratégia para o leilão.
A Altice fez saber à Anacom que a nova proposta de alteração das regras vem “desvirtuar por completo as regras do leilão do 5G, que fundamentaram toda a estratégia da Altice Portugal”.
Para a empresa liderada por Alexandre Fonseca, “impor” novas alterações, ao fim de mais de 150 dias de licitação, “não só não é minimamente admissível como é altamente gravoso para todos os licitantes”, porque as estratégias de licitação dos operadores estão “irremediavelmente” comprometidas.
A dona da Meo adianta, assim, que as opções estratégicas tomadas pela empresa “sairão totalmente frustradas”. A nova alteração terá “um impacto negativo transversal à estratégia de todos os licitante”, que são confrontados com uma incerteza “indesejável” que impõe o dilema: “se devem [os operadores] procurar adaptar a sua estratégia em face desta potencial modificação, se mantêm a estratégia que têm vindo a seguir ou se adotam uma eventual estratégia hibrida (com contornos de difícil execução e planeamento)”.
A licitação principal do leilão do 5G inclui os operadores Altice, NOS, Vodafone Portugal, Nowo (MásMóvil) e também a Dense Air, e visa a atribuição de direitos de utilização de frequências nas faixas dos 700 MHz, 900 MHz, 2,1 GHz, 2,6 GHz e 3,6 GHz, depois de uma primeira fase exclusiva para novos entrantes.
O processo tem sido bastante contestado pelas operadoras históricas, envolvendo processos judiciais, providências cautelares e queixas a Bruxelas, considerando que o regulamento tem medidas “ilegais” e “discriminatórias”, o que incentiva ao desinvestimento.
A atribuição das licenças 5G esteve prevista para o primeiro trimestre.
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