“A doutora Ana Gomes tem muitas dificuldades com a verdade, com o rigor e com a isenção”. Foi Daniel Proença de Carvalho quem o disse, em exclusivo ao Jornal Económico, quando instado a comentar as declarações proferidas por Ana Gomes que qualificou “alguns escritórios de advogados” como “verdadeiras associações criminosas” por participarem em esquemas de transferências de capital para contas offshores, no comentário na SIC Notícias, no domingo passado.
“Essa afirmação feita dessa forma genérica, que é evidente que não corresponde à mínima realidade, e é feita de uma forma muito ligeira, para não dizer leviana, como em muitos casos”, vincou o ex-jurista e antigo presidente do escritório de advogados Uría Menendéz Proença de Carvalho.
Daniel Proença de Carvalho, foi o orador convidado do debate inserido no âmbito do ciclo de conferências “Fim de Tarde na Sedes”, promovido pela SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, onde defendeu que a “mediatização” da Justiça acaba por denegrir a confiança que os portuguesas nela depositam
Questionado se os comentários de Ana Gomes traduzem esta mediatização da Justiça, Daniel Proença de Carvalho respondeu que “sempre que se opina e se comenta, com falta de rigor, com pouco respeito pela verdade, procurando generalizações e procurando fazer acusações infundadas ou apenas com base em percepções muito subjetivas, corre-se o risco de contribuir para o populismo.
“Em parte, o populismo também é feito de generalizações e de acusações deste tipo e da ideia de que os outros são sempre gente menos respeitável”, vincou.
Sobre as repercussões do Luanda Leaks no exercício do Direito em Portugal, o ex-jurista disse que preferia não comentar “casos concretos”, mas referiu que “os advogados e os escritórios portugueses, em termos comparativos com o que é a advocacia em toda a parte do mundo, hoje têm critérios de rigor, de cumprimento das normas. O escritório onde eu trabalhei [Uría Menendéz Proença de Carvalho] tem padrões da maior exigência e do maior respeito por regras deontológicas e éticas”.
Em janeiro, com o Luanda Leaks, Jorge Brito Pereira, advogado de Isabel dos Santos, renunciou ao cargo de chairman de detinha na Nos, como anunciou depois a saída do escritório de advogados Uría Menendéz Proença de Carvalho, onde exercia a profissão de advogado, que resolveu suspender.
Durante o debate, Daniel Proença de Carvalho foi desafiado a comentar o caso de Rui Pinto, o denunciante do Football Leaks, Luanda Leaks e das irregularidades que levaram a UEFA a banir a participação do clube de futebol inglês, o Manchester City, de participar nas próximas duas edições da Liga dos Campeões.
“Sou absolutamente contra a utilização de provas obtidas de forma criminosa. No dia em que isso fosse possível, as polícias podiam perfeitamente utilizar um bandido qualquer para entrar em minha casa, arrombar o cofre e tirar os documentos dos meus clientes”, disse.
“Qual é a diferença entre arrombar uma casa e roubar os documentos e entrar no correio eletrónico e fazer a mesma coisa? É exatamente igual”, vincou o ex-jurista. “Isso é uma coisa, outra é os polícias investigarem de acordo com os meios que a lei lhes proporciona. Porque se abrirmos a porta a soluções deste tipo, acabou o Estado de Direito, é o caos e é a inexistência dos direitos fundamentais das pessoas”.
O que disse Ana Gomes?
A antiga eurodeputada abordou diversos temas na SIC Notícias, no domingo passado, entre os quais a questão de se saber se o arresto das contas bancárias de Isabel dos Santos também abrangia os dividendos que a filha do ex-presidente angolano teria direito por deter posições acionistas em empresas como a Galp ou a Efacec.
Sobre a venda do EuroBic, banco em que Isabel dos Santos é acionista, Ana Gomes levantou a questão de se saber se “alguém vai controlar o produto da venda”.
Ana Gomes defendeu que a venda do EuroBic ao Abanca “desde que se garanta que o produto dessa venda fica congelado e naturalmente que fica à espera de uma decisão judicial sobre quem é que pertence, designadamente à engenheira Isabel dos Santos ou ao Estado angolano”.
“O que é que vai acontecer? Se a compra do EuroBic for feito diretamente entre o banco-mãe, que está na Venezuela, por trás do Abanca, e se for por transferência direta para offshores, para o Dubai, para a Rússia?”, questionou Ana Gomes, que disse que há mecanismos internacionais que devem ser “acionados pelas autoridades portuguesas para garantir que esse património não é dissipado”.
A antiga eurodeputada referiu ainda que o consórcio internacional que expôs o Luanda Leaks fez algumas revelações esta semana que, disse Ana Gomes, levam a concluir que “alguns escritórios de advogados portugueses – e mais uma vez, eu faço a ressalva, não são todos os advogados (…) -, que são verdadeiras, eu diria, quase associações criminosas, porque não são apenas instrumentos deste tipo de criminalidade [de branqueamento de capitais e transferências de capital para offshores], mas efetivamente engendram os esquemas”.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com