1. As nomeações familiares passaram a anedotário nacional e internacional, algo irrelevante se isso não significasse um novo motivo para desprestígio da classe política.
Uma das maiores dificuldades nos dias que correm para quem chefia um governo, e acreditamos piamente nisto, é encontrar uma equipa de confiança, sem telhados de vidro e sem a doença da ambição que o acesso ao poder permite. Só assim se justifica esta espécie de consanguinidade entre governantes, entre assessores e governantes ou entre quadros superiores de instituições públicas e membros do Governo.
Afinal isto até não significa nada, para além de violar a ética republicana, mas essa já é centenária e aguenta bem o embate. Será mais grave alguém com qualidade não poder ser assessor, parlamentar ou gestor pelo facto de ser filho de fulano ou fulana. Isso sim seria grave, porque se estaria a impedir que os mais aptos subissem a lugares merecidos.
O que talvez se tenha passado foi o exagero repentino e, talvez, o facto de não existir mais ninguém para além dos da tribo para a gestão da coisa pública. Não queremos acreditar que essa tribo imponha pessoas para lugares sem terem as devidas qualificações, porque se isso, algum dia, vier a ser demonstrado será o fim da credibilidade da tribo, o mesmo é dizer que serão eleições perdidas.
Entre nós percebe-se desde o período liberal a necessidade de manter dinastias em algumas famílias, porque, diga-se em abono da verdade, certas dinastias nasceram para a política. O próprio Afonso Costa fê-lo e antes dele foi Fontes Pereira de Melo que se encostou ao Duque de Saldanha, mas Fontes era filho de ministro. Salazar não o fez por não ter filhos, mas possivelmente outros ministros fizeram-no.
No período da democracia, lembremos Sá Carneiro, que chegou a emitir um despacho impedindo nos seus gabinetes estas nomeações de consanguinidade, o que revela que estamos num “quintal”. Mário Soares era filho de ministro e Cavaco Silva até nomeou um filho de Jaime Gama como assessor, o que o fez entrar no lote da consanguinidade e que nem era verdade. Mas a endogamia teve um ponto alto no século passado, no tempo de Cavaco, aquando das nomeações dentro da tribo de Valente de Oliveira e de todos os mestrados da altura.
Mas voltemos à anedota e à vontade de arranjar teorias da conspiração para tudo. O poder é uma tentação e o problema acaba por estar no desleixo, por deixar que se construam histórias engraçadas de Conselhos de Ministros em família, sem se perceber a eficiência destas soluções pois o trabalho começa na Gomes Teixeira à quinta-feira e pode continuar no seio familiar ao fim de semana.
Curiosa a recente intervenção de Marcelo. O Presidente terá alguma na manga quando diz que “família de presidente não é presidente”. Serão reminiscências dos tempos de criança.
2. A morte de João Vasconcelos esta semana é um claro desígnio do destino que primeiro leva os bons. Uma perda para a família, obviamente, mas sobretudo para o país. Todos perdemos um amigo e um cidadão ímpar.