Os bancos querem alterar o mecanismo de partilha de risco acordado na venda do Novo Banco ao Lone Star, no sentido de baixar a sua exposição. Alertam, também, para uma distorção da concorrência criada pelo mecanismo que foi aprovado.
Segundo soube o Jornal Económico, os bancos pedem que os ativos problemáticos sejam autonomizados numa unidade à parte e que a troca de obrigações gere reservas para o Novo Banco superiores aos 500 milhões previstos, para reduzirem a hipótese de terem de financiar o processo, se for usado o mecanismo de capitalização contingente.
O pedido foi feito através da Associação Portuguesa de Bancos (APB), que escreveu uma carta ao Banco de Portugal, enquanto autoridade de resolução, a sugerir alterações às condições em que os bancos são chamados a recapitalizar o Novo Banco, através do chamado mecanismo de capitalização contingente.
A carta, enviada há cerca de duas semanas, alerta para a distorção da concorrência e vem dar um conjunto de sugestões no sentido de melhorar o mecanismo de partilha de riscos associado à gestão dos ativos problemáticos, que estão no sidebank, e que consubstanciam a dimensão do risco assumido pelos bancos do sistema. Não foi possível obter a confirmação da APB.
Segundo revelou ao Jornal Económico fonte do setor, no conjunto de soluções destacam-se duas mais relevantes: num primeiro caso, a autonomização dos activos que estão no sidebank e que serão geridos pelo Fundo de Resolução – directamente ou por uma entidade exterior, nomeadamente pelo Novo Banco, através de um contrato de servicing.
O valor desses ativos era de 8.737 milhões de euros, líquido de provisões, em 31 de dezembro de 2016, mas agora rondará os 7 mil milhões.
Os bancos sugerem, assim, a criação de uma unidade de negócios autónoma que concentre apenas os créditos e outros ativos que serão vendidos pelo Fundo de Resolução, no âmbito do mecanismo de capitalização contingente no prazo de oito anos. Hoje, o sidebank é apenas uma designação e o que é proposto é que seja criada de facto uma unidade autónoma.
Recorde-se que está previsto um monitoring committee do Fundo de Resolução (que fica com 25% do Novo Banco), que terá acesso a toda a informação sobre os ativos problemáticos que estão no sidebank. A gestão desses activos será feita por esse comité independente, que terá um auditor. A Direção geral da Concorrência europeia não aceitou que o Fundo de Resolução (entidade pública) tivesse administradores no Novo Banco, por questões de distorção de concorrência.
Num segundo caso, sugerem que os obrigacionistas do Novo Banco aceitem perder mais de 500 milhões de euros. Isto é, que a almofada de capital gerada pela operação de troca de obrigações (com a designação técnica de LME-Liability Management Exercise), que está prevista e que é condição da eficácia da venda do Novo Banco, seja superior a 500 milhões de euros. Isto faz com que a partilha de risco com os obrigacionistas seniores seja mais favorável aos bancos do que o estava estipulado no contrato de promessa de compra e venda.
Sérgio Monteiro disse esta semana, aos deputados na COFMA, que “o esforço que está a ser feito na troca de obrigações do banco é no sentido de construir uma estrutura em que a proposta valha por si”, isto é, que seja “criadora de valor para todos”. O responsável pelas negociações da venda diz ainda que os “obrigacionistas estarão sempre mais protegidos no seu investimento se o banco for viável”. Os méritos da proposta levarão à adesão dos investidores.
O Jornal Económico sabe que, por isso, o Banco de Portugal está aberto a acatar a primeira sugestão, a autonomização do sidebank, mas quanto à segunda não tomará decisões que dificultem a atratibilidade da operação para os obrigacionistas do Novo Banco.
Sérgio Monteiro disse ainda aos deputados que o montante de capital que estão a tentar gerar através da troca de dívida “é para benefício do Fundo de Resolução e não do Lone Star. É um elemento de partilha de riscos potenciais entre todos os stakeholders. Estes 500 milhões servem para que seja menos provável uma injeção de capital por parte do Fundo de Resolução”.
Contactado, o responsável pelas negociações não fez comentários.
O acordo de venda do Novo Banco diz que só depois de esgotados os dois níveis de capital (1.000 milhões de euros do capital injetado pelo Lone Star e 500 milhões de euros de poupanças com a dívida sénior) é que o Fundo de Resolução poderá ser chamado a injetar capital no Novo Banco, no âmbito do mecanismo de capital contingente. O Fundo só tem obrigação de injetar o menor dos valores – entre a perda de valor dos ativos ou necessidades de reforçar o gap no rácio de capital face ao valor estipulado (12% Tier1)
O presidente da APB, Fernando Faria de Oliveira, já se manifestou publicamente preocupado com os custos da venda do Novo Banco para o Fundo de Resolução. “É que, na solução encontrada, foi determinado um mecanismo contingente que funciona como uma espécie de garantia que o Fundo de Resolução concede, e que pode vir a ter que ser ativado até um montante de 3,9 mil milhões de euros. Isto significa que a exposição dos bancos contribuintes para o Fundo de Resolução passa a ser na ordem dos 8,9 mil milhões de euros”, disse.
Embora salvaguardando que estes 3,9 mil milhões são contingentes e, portanto, podem não vir a ser acionados, o presidente da APB não escondeu preocupações: “Esta exposição exorbitante dos bancos do sistema ao Fundo de Resolução não pode deixar de preocupar quem quer que seja”, explicou, num encontro com jornalistas na semana passada. Reconheceu, também, que “continua a haver a necessidade desta negociação ser concluída no sentido de haver para os bancos contribuintes do Fundo de Resolução o menor esforço possível”.
A operação de troca de obrigações ainda está a ser desenhada e obrigará a um roadshow com investidores institucionais e partilha de informação a todos os obrigacionistas. A CMVM terá de aprovar o prospecto com as condições da Operação Pública de Troca.
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