Congratulamo-nos com a oportunidade histórica que a visão, missão, reformas e instrumentos, bem como o financiamento disponibilizado, contidos no atual PRR – Plano de Recuperação e Resiliência  proporcionará, não só mas também, no âmbito da habitação nacional. Trata-se de um momento chave e estratégico para a realidade nacional, para o planeamento e ordenamento do território, organização e recuperação das atividades económicas e vida social e cultural do país. Entre os problemas pré-existentes, mas agravados, estão os relacionados, direta e indiretamente, com a habitação.

Afiguram-se, contudo, os seguintes considerandos:

Primeiro. O PRR deve, nas dimensões de reforma, programas, instrumentos e medidas específicas, orientar-se pelos princípios e recomendações mais recentes apontadas, quer no Acordo Verde Europeu, quer no Relatório da Iniciativa “Acesso a habitação digna e acessível” (2019/2187(INI)) aprovado no passado dia 21 de janeiro de 2021, no Parlamento Europeu.

Segundo. Destacar a intenção de desenvolver uma Política de Investimento em Propriedade Pública de modo a contribuir para o aumento da oferta, designadamente, para o arrendamento a preços acessíveis, em parte já assumida nos diversos programas previstos na componente 2 (Habitação) da Dimensão “Resiliência”; deve contemplar o imenso parque habitacional devoluto de propriedade do próprio Estado, institutos públicos e IPSS.

Terceiro. Sublinhar a intervenção para a melhoria da Eficiência Energética em Edifícios (Componente 13), quer na construção nova, quer na reabilitação, esperando-se que tal melhoria não seja argumento para fazer aumentar o preço na construção e na reabilitação e, em consequência, pressionar o preço de venda e o valor das rendas. Por conseguinte, exigem-se medidas apropriadas para que tal não suceda, designadamente no plano da fiscalização e no plano fiscal e administrativo, quer quanto ao IVA aplicável quer quanto a taxas de licenciamento.

Quarto. Noutros Estados-membros, e de acordo com a União Internacional de Inquilinos, as obras profundas associadas à reabilitação energética de edifícios têm-se traduzido em aumentos diretos nos valores do arrendamento, recaindo o ônus desta transição no inquilinato, aumentando as taxas de esforço neste setor e aumentando o risco de despejo. A probabilidade de ocorrência dos efeitos nefastos que estas medidas podem ter no atual mercado de arrendamento português ultraliberalizado, sem regulação ou controlo de rendas, é elevada, apesar de forte regulamentação. Não esquecer que uma das principais causas de despejo em Portugal tem sido a realização de obras profundas.

Quinto. Insistir, mesmo que não seja matéria do PRR, na necessidade de intervir no arrendamento revogando a atual legislação, no sentido da regulação e registo do mercado, da sua fiscalização a montante e a jusante e na adoção de uma fiscalidade de acordo com a sua função económica e social, no seguimento de propostas apresentadas por stakeholders no sector, nomeadamente, pela Associação dos Inquilinos Lisbonenses.

Mas gostaríamos de destacar a especial relevância, o grande desafio e oportunidade que este momento representa para a Presidência Portuguesa da Comissão Europeia e para o futuro do direito à habitação nos vários Estados-membros da União Europeia (UE).

Especialmente considerando a realização da cimeira social e do Conselho Europeu informal, nos próximos dias 7 e 8 de maio, no Porto, com a aprovação final de uma declaração vinculativa sobre o pilar social da UE. Este será “o evento central” da presidência portuguesa. No dia 7, estarão no Porto os parceiros sociais europeus, representantes de entidades da sociedade civil, líderes políticos dos Estados-membros e responsáveis das instituições comunitárias, para assinarem uma declaração sobre o desenvolvimento do pilar social.

Os ministros irão discutir, pela primeira vez, o Plano de Ação sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais e espera-se que defendam a sua implementação sólida, não apenas como mensagem política forte para a cidadania europeia, mas como um eixo mobilizador dos esforços conjuntos para se avançar no domínio social, sobretudo na habitação e no arrendamento acessíveis. Isto ao mesmo tempo que se apoia a economia e a sociedade da UE na saída da crise. Reafirmamos aqui, portanto, a importância deste plano de ação estar ajustado aos planos nacionais de recuperação, permitindo o acesso às verbas comunitárias pós-crise.