A desigualdade de rendimentos é considerada um problema a ser resolvido. Na realidade, a desigualdade de rendimentos pode ser saudável, uma vez que gera incentivos para a inovação e o empreendedorismo, que estimulam o crescimento económico.

Se todos ganhássemos o mesmo, os incentivos para criar novos produtos, empresas ou tecnologias seriam pequenos. O que é importante salvaguardar é a igualdade de oportunidades e não necessariamente de resultados, ou seja, que as pessoas tenham igual acesso a educação ou formação, saúde, participação em cargos empresariais e políticos, etc.

Por outro lado, níveis altos de desigualdade podem gerar instabilidade social e, eventualmente, afectar a igualdade de oportunidades. Por exemplo, grandes desigualdades de rendimentos podem levar a que indivíduos exerçam influência na tomada de decisões, ou consigam benefícios não resultantes do mérito.

A análise de quais as fontes de desigualdade é fundamental para melhor compreender este fenómeno. Assim, é importante perceber qual o papel que as as empresas têm na dispersão salarial observada na sociedade. Será que há empresas que pagam salários em média mais altos que outras a trabalhadores com iguais níveis de competências? Ou a desigualdade de rendimentos é fruto de diferenças entre as competências dos trabalhadores, sendo algumas qualificações mais bem remuneradas que outras?

Song e co-autores (2019) decompõem a variação de rendimentos nos EUA em dois componentes: o que se deve à variação de rendimentos dentro da empresa, ou seja, a dispersão entre os salários mais baixos e altos pagos dentro de cada empresa, e o que se deve à dispersão dos salários médios pagos pelas empresas, designada variação entre empresas.

De acordo com este estudo, em 2013, cerca de 60% da variação de rendimentos deve-se à variação dentro das empresas. No entanto, quando comparamos 2013 com a dispersão salarial em 1978, a variação entre empresas é responsável por dois terços do aumento da desigualdade nos EUA. Esta variação entre empresas não se deve ao facto destas empresas terem políticas de compensação mais generosas, mas ao tipo de trabalhadores contratados por estas empresas terem maiores qualificações e talento.

Ou seja, as melhores empresas contratam trabalhadores com as melhores competências. Portanto, a dispersão de competências das pessoas é um elemento muito importante da desigualdade salarial, facto também observado em França por Abowd e co-autores (1999).

Por outro lado, Mueller e co-autores (2017) mostram que a dispersão de rendimentos dentro das empresas no Reino Unido é maior quanto maior for a empresa, e que a razão da dispersão é a maior disparidade dos salários mais altos em cargos de gestão.

Embora este resultado pareça sugerir que as empresas grandes geram maior desigualdade salarial, Silva (2019) mostra que as empresas podem moderar a desigualdade, uma vez que empresas grandes que têm unidades de negócio em diferentes sectores de actividade têm menor dispersão de rendimentos do que no cenário alternativo, em que estas unidades de negócio não estão dentro de uma única empresa.

Ao contrário dos EUA, Portugal e co-autores (2018) mostram que em Portugal a desigualdade salarial manteve-se relativamente estável entre 1988 e 2013. Apesar de se verificar que, como nos outros estudos, as qualificações dos trabalhadores são o elemento mais importante para explicar a dispersão salarial, a desigualdade não aumentou porque a qualidade das combinações empresa-trabalhador têm vindo a deteriorar-se e a dimensão das empresas diminuiu neste período.

Apesar do não aumento da desigualdade salarial ser um factor positivo em Portugal, estes resultados levantam questões que devem ser objecto de estudo mais aprofundado sobre quais as razões para a diminuição, por parte das empresas, da capacidade de crescimento e de contratação dos trabalhadores com as qualificações mais adequadas às suas necessidades.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.