Um dos temas que tem marcado a agenda política é a discussão em torno da permanência de Portugal na Zona Euro (ZE).
Principalmente depois do rebentar da crise financeira internacional de 2007/08, tornaram-se evidentes alguns problemas estruturais no desenho da ZE, com as economias mais periféricas a sentirem os impactos mais profundos dessa crise e a terem enormes dificuldades para ultrapassar esse problema.
No caso português, as dificuldades socioeconómicas já vinham desde o início do século, coincidindo com a entrada na ZE, com Portugal a ter crescimentos anémicos e a acumular défices externos e, depois da crise de 2007/08, a evidenciar aumentos significativos no desemprego, na emigração e a patentear uma dívida pública insustentável
Neste momento, todo o exercício especulativo acerca do que teria acontecido caso Portugal não tivesse aderido ao Euro não tem grande sentido (o contra-factual é impossível). Mas é fundamental percebermos quais são as alternativas para o futuro e quais os riscos que cada uma delas acarreta.
Penso que os principais cenários sobre os quais importa reflectir são os seguintes:
- Portugal permanece no Euro, aceita disciplinadamente as actuais regras da ZE e tenta criar, internamente, as condições estruturais para que o Euro lhe assente bem. Na prática, isso equivale a tornar Portugal numa Alemanha. Esta opção é virtualmente impossível, uma vez que nunca um país pequeno, e geograficamente periférico, conseguirá ter a significância de uma grande económica central como a alemã. Mesmo no melhor dos cenários, em que Portugal encetaria uma revolução da sua estrutura económica e cultural, tornando-se numa encomia ultracompetitiva internacionalmente, seria sempre um processo muito demorado, havendo mesmo fundadas dúvidas de que tal transformação fosse possível no quadro das actuais restrições impostas pela ZE.
- Portugal permanece no Euro, mas tenta ganhar força política, forjada com alianças dentro da União Europeia, para que seja possível efectuarem-se alterações nas regras de funcionamento da ZE de forma a que os países periféricos não sejam tão castigados pelo seu atraso económico e que os países que têm beneficiado com a actual ZE sejam obrigados a contribuir mais, para que se voltem a verificar processos de convergência na União Europeia – e não mais de divergência como tem acontecido desde a criação da ZE. Este seria o cenário ideal, reformista, mas que tem um enorme obstáculo: convencer os povos dos países mais ricos que teriam, no futuro, a ganhar com tal convergência, embora pudessem ter que suportar um pouco mais de custos a curto prazo.
- Portugal sai da ZE através de negociações pacíficas com os restantes membros, que chegam ao entendimento de que é melhor para todos (mais ricos e mais pobres) que esta separação se dê, devolvendo às economias periféricas a sua autonomia de política monetária como mais um instrumento para encetarem um processo de crescimento. As dificuldades aqui são, principalmente, duas: falta de vontade política para que os processos de separação se verifiquem (vejam-se as complexidades do Brexit) e a ausência de garantias de que a política monetária dos países periféricos fosse bem utilizada pelos próprios.
- Portugal sair “unilateralmente” da ZE. Este caso seria altamente problemático, uma vez que criaria um choque económico brutal, com o Banco Central Europeu a cortar o crédito a Portugal, as agências de notação a baixar os ratings do país para os níveis mais baixos, a desvalorização abrupta da moeda que Portugal criasse, fortes probabilidades de bancarrota, recessão e problemas comerciais. Por mais injusto e punitivo que este quadro seja, seria o mais provável de acontecer. Nada de perpétuo, bem entendido – não é provável que um país com quase 900 anos de existência fosse agora desaparecer –, mas com elevadíssimos custos de curto e médio prazo.
A verdade é que nenhuma das alternativas se apresenta como fácil para o interesse dos portugueses. Porém, o debate sobre estas hipóteses, o encarar os riscos, custos e benefícios de cada possibilidade, sem dogmas nem tabus, é a única forma de planearmos o futuro de Portugal, que se deseja melhor do que os dias complexos que tem vivido neste início de século.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.