Teríamos de ter conhecimentos de psicologia, que não possuímos, para compreender com detalhe o ressabiamento que Wolfgang Schäuble tem com Portugal. Se acamássemos o ministro das Finanças alemão num divã e o embalássemos com uma lengalenga suave, talvez conseguíssemos que este desabafasse o que tanto o incomoda no atual Governo português. Nessa impossibilidade, tiramos uma “psicologia barata” da algibeira e debruçamo-nos sobre o ministro alemão para analisar os seus mais recentes desvarios e os eventuais prejuízos que daí possam advir para a economia portuguesa.
Sabemos que Wolfgang foi um brilhante estudante de direito, que o seu nome do meio é “ambição” e que o seu último apelido é “frustração”. Até aos 30 anos Schäuble “estava a ser bem-sucedido” e acabou por se tornar num deputado do parlamento alemão, sempre com o fito de alcançar o topo do poder. Wolfgang “continuou a ser bem-sucedido” e foi ministro sem pasta, depois chefe de Chancelaria, mais tarde ministro do Interior e agora ministro das Finanças. Foi, ainda, responsável pelas negociações para a reunificação da Alemanha, “continuando a ser bem-sucedido”, até que, após esse momento histórico, a sua história mudou: em 1990 saiu paraplégico de um atentado.
O sucesso do alemão deu lugar a uma maldição que não ficaria por aqui: depois de regressar à política com a mobilidade física comprometida, um escândalo relacionado com um donativo de 100 mil marcos de um comerciante de armas feito ao seu partido comprometeu também a sua mobilidade política. Acabou por ficar sentado a ver a jovem promissora Angela tomar as rédeas do que sempre havia almejado e tornou-se naquilo que apenas tinha ao seu alcance: ser súbdito de Merkel. O homem que havia desejado o sol, não passava agora da sombra de uma mulher poderosa que lhe atribuiu primeiro a pasta do interior e, mais tarde, a pasta das contas por lhe reconhecer pulso forte com as finanças.
A azia de Wolfgang foi, então, dando origem a muitos “arrotos políticos” sob a forma de “avisos” a Portugal: incentivou a aplicação de sanções a Portugal por parte da Comissão Europeia; alertou para o facto de o país não gozar de “grande resiliência”; disse que o Governo português ia pedir, e ter, um novo programa de resgate; insinuou que as medidas de António Costa estavam a deixar os “mercados nervosos”. Mais recentemente, Schäuble afirmou numa conferência em Bucareste, na Roménia, que Portugal estava a ser “muito bem-sucedido até ao novo Governo” liderado por Costa.
Não receando a pirose de Schäuble, o “Dom carismático” Sócrates respondeu a uma das suas muitas insinuações com o mesmo nível do alemão, dizendo que este era um “estupor” e um “filho da mãe”. António Costa, ciente das suas atuais funções e da importância das relações diplomáticas para as políticas europeias, foi um pouco mais polido, respondendo assertivamente “só dar atenção ao que dizem os alemães que conhecem Portugal, sabem do que falam e não se inspiram no preconceito”.
Com este enquadramento da vida do alemão ressabiado, percebemos a sua necessidade de exortar uma “política do bota abaixo”, de arrogância, sobranceria e altivez. Do baixo da sua cadeira de rodas, Schäuble “olha de cima” para Portugal. Se pode ter esta atitude e lançar estes avisos? Pode. Afinal é o ministro das Finanças da maior potência europeia. Se o deveria fazer? Não, porque pode ser “mal-entendido” pelos mercados e empresários que, desse modo, podem desinvestir em Portugal – comprometendo também assim a Europa – e porque pode ser “bem entendido” por aqueles que acham que isto são apenas manobras de diversão para desviar o olhar da comunidade internacional dos graves problemas internos da Alemanha.
Conscientes de que este governante alemão muitas vezes se desdiz, devemos ouvi-lo, mas não considerá-lo. Agora que até sabemos que a Comissão Europeia parece satisfeita com o orçamento português, Portugal pode equacionar recorrer à “APAV europeia” para se defender da violência de Schäuble e talvez encontre à sua frente, na fila, o próprio Schäuble a apresentar queixa do ‘bullying’ que sofreu no nosso país e que, quiçá, está na origem de toda esta indigestão. Perceber que tudo isto é resultado da parvoíce de Mário Crespo e Ruben de Carvalho, que censuraram o “servilismo” na pose de Vítor Gaspar, curvado perante o “presunçoso” ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble durante uma reunião do Eurogrupo…