Nesta era de revoluções da Inteligência Artificial (IA), a constante mudança e a dificuldade em fazer previsões aproximadas do futuro leva ao florescimento de diversas “profecias”, umas com mais pedigree do que outras.

Aquela que me chamou a atenção foi a de Sam Altman, CEO da Open AI. Num tweet, no agora X, o cocriador do ChatGPT escreveu o seguinte: “Espero que a IA seja capaz de persuasão sobre-humana muito antes de ser sobre-humana na inteligência geral, o que pode levar a alguns resultados muito estranhos”. Esta “profecia” não é um mero salto tecnológico, é uma revolução no tecido socioeconómico da nossa sociedade.

A super-persuasão da IA redefine a arte da influência. Não se trata apenas de uma máquina que “convence melhor”. É uma entidade que compreende e manipula as nuances psicológicas humanas com uma precisão e adaptabilidade que ultrapassa os mais talentosos oradores gregos. Este é um desafio não apenas técnico, mas fundamentalmente ético e social.

A distinção entre super-persuasão e inteligência geral super-humana é crucial. Enquanto a última se refere a uma capacidade ampla e profundamente informada, a super-persuasão refere-se à capacidade de influenciar decisões, comportamentos e, por extensão, o poder.

Os cenários potenciais são variados e complexos. Desde campanhas políticas dirigidas por IA que modelam o discurso público a empresas que moldam o consumo com precisão psicológica e geográfica, o poder da persuasão da IA pode servir ou prejudicar a sociedade, podendo exacerbar disparidades, concentrando o poder nas mãos de quem detém o “capital cognitivo” da IA.

As implicações éticas são também vastas e profundas. A persuasão com IA e sem qualquer controlo poderia subverter a autonomia, manipulando escolhas individuais e coletivas. A noção de consentimento informado e livre-arbítrio enfrentaria desafios sem precedentes.

É imperativo implementar salvaguardas e medidas regulatórias. Uma governança transparente e inclusiva, normas éticas para o desenvolvimento e a utilização de IA, e uma contínua revisão das práticas são passos necessários. A educação pública sobre IA e a sua capacidade de persuasão é também fundamental para uma sociedade informada e resiliente.

Neste capítulo assistimos recentemente à Ordem Executiva do presidente Joe Biden para a IA, que tenta regulamentar esta tecnologia com o intuito de a tornar mais segura e confiável. Também na Europa estamos prestes a ver o European AI Act, onde o Parlamento Europeu pretende impulsionar a IA garantindo ao mesmo tempo a segurança e os direitos dos cidadãos da União Europeia.

Num futuro próximo, poderemos assistir a diálogos no ciberespaço onde a(s) AI(s), à semelhança de Platão no seu púlpito digital, nos desafiam, nos convencem e talvez nos conduzam. Deveremos estar preparados para garantir que esta nova era de persuasão superinteligente opera dentro de um quadro que respeita a dignidade humana e promove uma sociedade justa.

O aparecimento de IA com capacidades de persuasão sobre-humanas, tal como antecipado por Sam Altman, anuncia uma mudança de paradigma não apenas nas capacidades tecnológicas, mas, mais criticamente, nos tecidos socioeconómicos da nossa sociedade.

Embora tais avanços prometam eficiências e vantagens competitivas sem paralelo, também são um presságio de uma versão do futuro em que a própria natureza da influência e do poder poderia ser monopolizada por aqueles que detêm esse capital cognitivo, potencialmente exacerbando as disparidades existentes e inaugurando uma nova era de estratificação, a menos que medidas proativas e equitativas sejam implementadas.

A pergunta que vos deixo é a seguinte: estaremos à altura de criar e manter o equilíbrio necessário para garantir que a super-persuasão da IA seja uma força para o bem coletivo e não uma ferramenta para a ampliação das fissuras já existentes na estrutura da nossa sociedade?