Numa Europa em que questões como a vaga de emigrantes, oriundos de África e do Médio Oriente, os tanques russos na Crimeia e na Ucrânia Oriental, a Nova Rota da Seda chinesa, entre outros assuntos, parecem dominar as preocupações do Conselho Europeu, se me permitem, gostaria de abordar a construção inacabada da União Bancária e os perigos que isso acarreta para uma pequena economia aberta como é o caso da nossa.

Dizia, em Março, com todo o propósito, o primeiro-ministro António Costa que a União Bancária está num estádio imperfeito, ou incompleto, em que as autoridades europeias têm o poder de ‘resolver’ os bancos (e, por ora, apenas Portugal foi a cobaia), mas ainda não constituíram “a garantia comum de depósitos e a garantia comum para os fundos de resolução nacionais”. Portanto, supervisionam, impõem resoluções, mas os custos de eventuais más decisões incidem exclusivamente sobre os países cujos bancos foram (ou poderão vir a ser) ‘resolvidos’.

Com uma União Bancária incompleta, em tempos marcados pela transição e pela mudança, há riscos à espreita e a carecer de outra atenção. É o caso das fintechs que operam livremente, a partir da internet e de apps, no mercado português.

Nem de propósito, uma dessas fintechs, que se gaba de conquistar entre 300 e 400 novos utilizadores portugueses diariamente, tem sido alvo de escrutínio mais atento. Fundada por dois britânicos de ascendência russa, a dita fintech está a ser investigada pelos critérios laxistas em relação ao branqueamento de capitais e por ter desactivado os mecanismos automáticos de inibição de transacções suspeitas pelos seus clientes. Esta fintech comercializa cartões, virtuais ou físicos, recarregáveis, quais ‘cheques de viagem’ modernos, e ainda permite o acesso a uma ‘bolsa’ para compra ou venda de criptomoedas. Inicialmente tratava-se apenas uma aplicação para telemóveis. Porém, para surpresa de muitos observadores, recentemente conseguiu uma licença bancária europeia atribuída pelo Banco Central Europeu.

De acordo com as referidas investigações, o responsável máximo alterou os sistemas informáticos, de forma a que aquilo que é a norma nos bancos de retalho não o fosse nesta fintech: a inibição de transacções e transferências sempre que alguma pessoa física, ou empresarial, conste das listas de suspeitos dos organismos internacionais de combate ao branqueamento de capitais, de financiamento ao terrorismo ou ao crime organizado. Coisa pouca, como se percebe facilmente.

Sem surpresas, nestes últimos três anos, a fintech em questão viu sair dois administradores responsáveis pelo risco, dois directores com responsabilidades de prevenção de branqueamento de capitais, um responsável pelo sistema de controlo do cumprimento (compliance) e um administrador financeiro, entre outros.

Uma autêntica ‘revolução’, esta União Bancária, imperfeita, que permite a concorrência desleal e ignora as mais elementares regras de bom senso. Uma União Bancária que impõe custos de cumprimento aos bancos de retalho, mas deixa que fintechs, sem modelo de negócio perceptível, sem presença física, possivelmente sem pagarem impostos nos mercados onde têm clientes, operem no espaço europeu de forma despreocupada em relação às regras e aos sistemas de controlo…

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.