A livre circulação de pessoas e mercadorias na União Europeia (UE) ainda está em vigor graças ao Acordo de Schengen, que engloba também países não pertencentes à UE. Mas, muito mudou nos últimos tempos fruto, quiçá, das ondas de refugiados, do despertar ou do ressurgimento de populismos no Velho Continente.

A semana passada, vivi duas situações que me fizeram pensar em outras com que me defrontei há pouco mais de dois anos. Num intervalo de apenas dois dias, tive a oportunidade de verificar como as fronteiras da Europa já não são o que idealizámos.

Desde que, há dois anos, o controlo de fronteiras foi temporariamente retomado, atravessar a ponte de Öresund, entre a Dinamarca e a Suécia, obriga à apresentação de um documento de identificação. Como todo o cuidado é pouco (fui avisada), o melhor mesmo é apresentar um passaporte, não vá o “diabo tecê-las”. Assim fiz, mesmo que perante o descrédito e a abnegação.

No dia anterior, passando a fronteira entre a Suíça e a Alemanha, vi-me pela primeira vez na necessidade de apresentar documentos de identificação. Não apenas eu, mas todos os que estavam comigo no carro. Embora educado, o polícia não se coibiu de fazer as mais distintas expressões faciais quando lhe expliquei que não era turista – por enquanto, pelo menos.

Estas duas situações fizeram-me recordar várias viagens, sempre por terra, curiosamente, onde a viagem no Eurostar, especialmente quando chegava a Paris vinda da Alemanha, me confrontava com um claro racial profiling, ilegal e geralmente não me incluindo, dos passageiros que ali desembarcavam. Nessa altura, por obrigações profissionais, também entre a Áustria e a Alemanha, num comboio vindo da Itália, o mesmo profiling claramente existiu.

A Europa que foi sonhada no pós-Segunda Guerra Mundial desenvolveu-se em sentidos que todos nos devemos orgulhar, mas, atenção, tudo se reverte muito rapidamente. Estejamos nos “países mais civilizados” ou não, esta ânsia de sobrevivência pautada, tantas vezes, por desinformação e estigmas que, estatisticamente, não fazem sentido algum, faz reverter anos de tentativas de nos elevarmos aos melhores princípios da Humanidade.

Tudo muda muito rapidamente e muito rapidamente podemos nós, também neste canto do mundo, regressar a velhos vícios. É fundamental combater esse movimento falacioso que é reforçar as fronteiras e deitar abaixo as pontes.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.