O verão empurra-nos para as aglomerações, materializadas em filas intermináveis em estradas e restaurantes que se têm transformado num verdadeiro símbolo da estação.

Há um século, a estrutura tayloriana de controlo científico das empresas começou a garantir aos trabalhadores maior previsibilidade da sua remuneração e a disponibilidade de tempo livre, dando origem às classes médias. No verão, essa disponibilidade de recursos e tempo é moldada pela sociedade de consumo e multiplicada pelo espírito gregário das pessoas, provocando uma massificação turística já hoje palpável em muitos destinos do país. Embora odeie as aglomerações, fascina-me a vontade de agregação do ser humano e as suas consequências, como a uniformidade social e o pensamento único.

A tecnologia tem tido um impacto determinante na massificação do turismo. A difusão de imagens, opiniões e vivências nas redes sociais criam um estado de opinião favorável à escolha de determinados destinos. Paradoxalmente, a tecnologia serve ao mesmo tempo para convocar fisicamente as massas em determinados lugares e, uma vez lá, para as alienar e as agregar a outras multidões virtuais através das redes sociais. O pior dos dois mundos.

A tecnologia facilita as nossas vidas, mas também nos abstrai de desfrutar dela. Descaracteriza o indivíduo, mas multiplica a força das massas. Não tem havido um tempo na história em que as massas, agora também num formato digital, tenham tido tanto poder para influenciar escolhas e censurar comportamentos. A viralidade das redes sociais garante uma instantaneidade frequentemente irreflexiva que faz com que a tecnologia, além das suas características de facilitação e alienação, também seja um enorme instrumento de manipulação.

Pensávamos até há pouco que a tecnologia ia transformar-nos em indivíduos mais livres, melhor informados e mais poderosos.  Há trinta anos, num mundo ainda dominado pelos produtos e não pelos serviços, as incipientes tecnologias da informação prometiam a chamada “personalização massiva” na escolha, por exemplo, do nosso carro. Essas tecnologias permitiam-nos conjugar umas poucas dúzias de opções para configurar uma peça única entre um milhão.

Mas o impacto da traslação dessas tecnologias ao mundo dos serviços digitais tem provocado uma exponencialização que multiplica o impacto coletivo em detrimento do individual. Nessa base, além do efeito tecnológico das massas, existe um efeito ainda maior da tecnologia sobre as massas.

Temos já provas claras de que a tecnologia facilita, abstrai e manipula, mas resta ainda saber até que ponto nos vai controlar. As tecnologias de inteligência artificial vão trazer muitos benefícios, mas também enormes riscos nesse sentido. Há quem pense que essas tecnologias só serão úteis para analisar comportamentos massivos através da estatística, mas poderão demorar décadas em inferir comportamentos de indivíduos supostamente inteligentes e complexos.

Admitem-se apostas, tanto sobre a velocidade da tecnologia como da inteligência das massas.