“A Autoridade da Concorrência (AdC) condenou 14 bancos ao pagamento de coimas no valor global de 225 milhões de euros por prática concertada de troca de informação comercial sensível, durante um período de mais de dez anos, entre 2002 e 2013 (…). “(…) referente à oferta de produtos de crédito na banca de retalho, designadamente crédito habitação, crédito consumo e crédito empresas.”(1)

Saúda-se a decisão da AdC. Mas a reflexão sobre os impactos/custos do crime cometido por todo um sector charneira para a economia e a sociedade – não estamos a falar de 14 bancos, mas de todo o sistema bancário nacional – em matéria de tanta relevância como é o valor da taxa de juro e a sua duração por um longo período – mais de dez anos – obriga, mais uma vez, a questionar o sistema.

Porque o que agora ganhou visibilidade com a banca, soma-se a outros processos levantados pela AdC e outras entidades reguladoras sectoriais, como a ERSE, a ANACOM, e o próprio Banco de Portugal, nos seguros – logo o problema atinge todo o sector financeiro –, na energia, na grande distribuição, nas telecomunicações e correios, nos transportes (aeroportos, autoestradas), na construção civil, etc.. Isto é, praticamente em todos os sectores produtores de bens e serviços de uso transversal pela economia e famílias, e ditos “não transaccionáveis”, por exposição nula ou reduzida, à concorrência externa.

Porque o que está em cima da mesa são processos de cartelização de facto, muitos dos quais por investigar aprofundadamente (caso dos combustíveis) e também os abusos de posição dominante e de dependência económica, por empresas monopolistas/oligopolistas, produtoras/fornecedoras desses bens e serviços, e o seu poder de influência/subordinação do poder político. O que é o resultado dos processos de privatização de empresas públicas, muitas monopólios naturais, desregulamentação e liberalização dos respectivos mercados  (por exemplo, a liberalização da instalação de grandes superfícies comerciais!). Processos avançados e decididos por sucessivos governos do PS, PSD e CDS, que iam garantir a “sã e livre concorrência” e, por esta via, a baixa de preços/tarifas e melhor acesso. Ora aconteceu precisamente o contrário, como as “rendas da energia”, e agora o cartel da banca, abundantemente demonstram.

Os problemas presentes na generalidade desses mercados e sectores de actividade, praticamente sem excepções, evidenciam também a incapacidade e impotência das entidades reguladoras para os evitar e travar (que devia ser em tempo razoável), contrariamente ao que era sua missão e promessa dos responsáveis da política de direita. O que se constata é a normal intervenção tardia dos reguladores, os longos prazos conseguidos pelos prevaricadores na dilatação do tempo dos processos de investigação e decisão dos reguladores e tribunais (no caso da banca já vamos em sete anos!).

Constatamos a fragilidade dos reguladores, bem visível na forma como quase por acaso, por zanga de comadres, descobrem as ilegalidades. Repare-se: no caso da banca, foi necessário que um parceiro do cartel, ao fim de dez anos, resolvesse pôr a boca no trombone. Até esse momento, AdC, Banco de Portugal, Ministério das Finanças e Ministério da Economia nunca tinham dado pelo problema!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

 

(1) Comunicado 17/2019 da AdC.