Só quem anda distraído é que se espanta com a greve na Autoeuropa. Quem sabe da história do sindicalismo e em particular das suas vicissitudes no Portugal pós 25 de Abril dirá que nada do que está acontecer surpreende. Com novos protagonistas e algumas alterações de circunstância temporal e fáctica a História repete-se. Em primeiro lugar, quem hoje lidera a representação dos trabalhadores na empresa é um sindicato ligado ao PCP. Mas não se tratou de uma transição pacífica e democrática, como alguns parecem fazer crer. Foi um “assalto ao Castelo” nas palavras do coordenador demissionário da Comissão de Trabalhadores, Fernando Sequeira.

Um “assalto”, convenhamos, não é propriamente uma mudança democrática. E, pelos vistos, não será porque os novos líderes laborais da Autoeuropa são “quatro ou cinco populistas” que a maior parte dos trabalhadores “nunca viram na vida”. Quem o diz não sou eu e sim António Chora, o anterior presidente da Comissão de Trabalhadores, hoje reformado. Chora não tem dúvidas de que a greve terá muita adesão, porque os trabalhadores “estão demasiado instrumentalizados e demasiado confiantes nas palavras” dos tais quatro ou cinco populistas que nunca ninguém viu.

E para que serve este assalto ao Castelo? É uma “tentativa do PCP pressionar o Governo para algumas cedências noutros lados”, diz o mesmíssimo António Chora. Mais claro não poderia ser. E se começarmos a somar dois mais dois é bem capaz de dar quatro. Pelos vistos estarão a acontecer coisas gravíssimas na PT, empresa privada recorde-se, a ponto do primeiro-ministro ter ficado de tal forma chocado que não se calou. Já por duas vezes denunciou a vida laboral na PT e, acto contínuo, as brigadas de choque da inspecção do trabalho prontamente se perfilaram e não sei se não avançaram mesmo.

Agora, perante situações aparentemente ainda mais graves, a ponto de gerarem greve geral na empresa, também privada, que mais contribui para a riqueza do país, silêncio absoluto. Esta duplicidade de atitudes só encontra explicação, creio eu, à luz do desabafo do anterior líder da Comissão de Trabalhadores. Ou seja a greve geral da Autoeuropa é essencialmente política e obedece à estratégia do PCP no contexto da “geringonça” que nos vai desgovernando.

É claro que dito isto não sei quantos anónimos comentadores, após me remeterem para o campo do “fascismo”, dirão que o que há são verdadeiras questões de trabalho como, por exemplo, a do “trabalho ao sábado”. Nos dias que correm (e nos dias que já passaram), todas as greves verdadeiramente políticas não deixam de assentar em questões laborais. E algumas delas bem justas.

O resultado de tudo isto? A palavra, de novo, a António Chora: “Orgulho-me de ter sido membro de uma CT que começou numa fábrica com 144 pessoas. Saí de lá com 4 mil, contrariamente a muitos sindicatos que entraram com 11 mil trabalhadores e saíram com ninguém, como na Lisnave, CUF ou Quimigal”. É pena mas é a História.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.