O OE2020 pode ter as contas certas. O futuro do país é que continuará incerto, pela continuação da ausência das necessárias respostas do Estado a problemas que hoje, de forma crescente, ameaçam a sustentabilidade desta comunidade. O OE2020 pode ser “histórico”. Mas não é pelas boas razões. As que poderiam abrir caminho a uma ruptura com um passado e presente de degradação das suas infraestruturas físicas e de conhecimento; à travagem do afundamento demográfico e sangria emigratória; ao agravamento das desigualdades sociais e elevados níveis de pobreza e carências e à continuidade das assimetrias no território nacional, por mais secretarias de Estado que descentralize o Governo.

Há quem fale da “coragem” do Governo no “esforço de consolidação orçamental”, negando aos trabalhadores da Administração Pública a resposta que seria curial após dez anos de congelamento de salários. “Coragem” ao negar aos pensionistas e reformados uma nova subida extraordinária das suas pensões e reformas. “Coragem” ao negar aos serviços públicos, nomeadamente no SNS, na Escola Pública, nos Serviços de Segurança, o reforço de trabalhadores e recursos capazes de garantir a sua eficácia e resposta aos problemas da população. “Coragem” ao aceitar a continuidade das restrições no investimento público, perante o previsto abrandamento do reduzido crescimento da FBCF nos anos anteriores.

De facto é, a coragem de quem não tem coragem para enfrentar os “patrões” de Bruxelas e os patrões do grande capital nacional e estrangeiro. Submetendo-se às imposições de constrangimentos e limites orçamentais que os primeiros não se obrigam nem cumprem nalguns dos principais países do directório comunitário. Demitindo-se face aos segundos de uma imposição fiscal e um combate à fraude e evasão, que ajudassem a reduzir a injustiça no sistema fiscal português. Tudo agravado pela falta de coragem para enfrentar o sorvedouro de dinheiros públicos que mais uma vez vão representar as PPP e as ajudas à banca.

Mas não desesperemos porque vamos certamente ter durante o ano que se avizinha a choradeira de crocodilos e carpideiras pelos pobres, os sem-abrigo, os baixos salários, o adiamento das cirurgias e o encerramento de serviços de urgência, as escolas que fecham por falta de trabalhadores e o amianto que nunca mais é retirado, por desastres em pedreiras e buracos nas estradas, por aldeias que perdem o último morador, por muitos hectares de floresta ardida em terras com dono, por atrasos na atribuição de reformas ou no pagamento dos subsídios de funeral, por concursos de obras públicas desertos e a contratação de reformados para fazer o trabalho dos novos que vão continuar a atravessar a fronteira. A choradeira de um país de velhos porque o futuro já não quer cá nascer…

Outro caminho é preciso percorrer. Outras opções políticas são precisas para responder aos problemas do povo e do país. Ou seja, o OE2020 só lá vai com uma grande volta.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.