A União Europeia (UE) é frequentemente descrita como um gigante económico e um anão militar: tem peso regulamentar, mas falta-lhe força para impor a sua vontade no xadrez geopolítico. Ser uma potência global exige mais do que influência económica — implica protagonismo militar, diplomático e estratégico, com capacidade para moldar os acontecimentos à escala mundial. A UE, no entanto, continua a agir de forma reativa e com alcance limitado.

Com o regresso de Donald Trump e do movimento MAGA ao centro da política americana, os Estados Unidos têm-se afastado do seu papel histórico como pilar da segurança ocidental. A ruptura tornou-se particularmente evidente no contexto da guerra na Ucrânia: desde a tensa receção de Zelensky na Casa Branca até à recusa de Washington em apoiar uma resolução da ONU — redigida por países europeus para condenar a agressão russa e reafirmar a integridade territorial da Ucrânia — o fosso transatlântico alargou-se.

Como a defesa europeia continua dependente da NATO — na prática, de Washington — a vulnerabilidade estratégica da UE ficou ainda mais exposta. Neste novo cenário internacional, impõe-se a pergunta: poderá a União Europeia ultrapassar o seu papel regional e afirmar-se como uma potência global? Tal como está hoje estruturada, a resposta é clara — não.

Sem instrumentos militares — o chamado hard power — a União Europeia projeta-se no mundo através do seu peso económico e da imposição de normas: o chamado poder normativo. Alguns académicos chegam a falar numa “analogia imperial”: Bruxelas não impõe pela força, mas ameaça com a exclusão do mercado interno. O problema? Essa influência é frágil e quase sempre depende da vontade dos outros. Sem uma perspetiva credível de adesão, muitos países não têm qualquer incentivo real para alinhar com os valores europeus.

As inconsistências da Política Europeia de Vizinhança revelam bem os limites do poder externo da UE. O programa oferece apoio financeiro e acesso preferencial ao mercado europeu em troca de reformas políticas e económicas. Mas na prática, só funciona com países que já são relativamente estáveis. Marrocos, por exemplo, recebeu um plano de reformas ambicioso, com metas claras de alinhamento com normas europeias. Já os planos para a Tunísia e a Argélia são vagos e evitam exigências políticas. Porquê? Bruxelas receia que pressionar regimes frágeis possa gerar instabilidade, migrações ou radicalização.

O caso do Azerbaijão é ainda mais revelador. Ignorou compromissos básicos em direitos humanos e, mesmo assim, continuou a receber fundos europeus — reflexo da dependência energética da UE. Ou seja, a União só tenta mudar quem já está predisposto a mudar. Aplica pressão onde é mais seguro, e recua onde seria mais necessário. Isso torna a sua política externa incoerente — e fragiliza a sua credibilidade como ator global.

Enquanto as potências globais moldam a realidade, as regionais limitam-se a reagir. A União Europeia, preocupada com a sua imagem internacional, aposta na legalidade e no multilateralismo. Pratica uma espécie de headline diplomacy — participa em fóruns, assina declarações conjuntas e destaca-se em áreas como o clima, o terrorismo ou a proliferação nuclear. Sim, coopera — mas não lidera, e, acima de tudo, não antecipa.

O exemplo é claro. Mesmo após a anexação da Crimeia, em 2014, a maioria dos Estados-membros ignorou a meta dos 2% do PIB em despesa militar. Só com a invasão em larga escala da Ucrânia é que alguns começaram a rever prioridades — e só três anos após o início da guerra, quando a eleição de Donald Trump expôs a fragilidade da aliança transatlântica, é que a União propôs finalmente um plano para se rearmar.

Tudo isto revela uma aversão estrutural ao risco. A UE reage tarde, com hesitação, e mantém-se à margem das grandes decisões de segurança. Uma potência que evita o confronto dificilmente impõe respeito no palco internacional.

Foi precisamente por isso que, no contexto da resolução da guerra na Ucrânia, acabou relegada para segundo plano por Donald Trump e Vladimir Putin — apesar de, por razões geográficas e estratégicas, ser quem deveria ter assumido a liderança.

Por fim, a crescente fragmentação interna continua a ser um dos principais entraves à política externa europeia. A Hungria e a Eslováquia têm bloqueado posições comuns, e na Alemanha, a AfD — partido de direita radical que já é a segunda força política — defende abertamente a reativação do Nord Stream 2. Esta falta de unidade mina a credibilidade e a coerência da União. O resultado é uma política externa inconsistente. Exemplo disso é a importação, por vários países europeus, de combustíveis oriundos da Índia — que, na prática, revendem produtos refinados a partir de petróleo russo, contornando as próprias sanções da UE.

A ambição de se tornar uma potência global exige da União Europeia aquilo que hoje lhe falta: visão estratégica, unidade política e capacidade para agir com autonomia. No papel, a UE tem escala económica, peso diplomático e legitimidade normativa. Mas, na prática, continua presa a hesitações internas, à dependência militar dos Estados Unidos e a uma abordagem externa que privilegia o risco zero. Enquanto não resolver estas fragilidades — e enquanto continuar a aplicar pressão apenas onde é politicamente seguro fazê-lo — a União permanecerá confinada ao seu papel de potência regional. Influente, sim. Mas incapaz de moldar o mundo à sua medida.