Vou instalar um sistema solar fotovoltaico (PV) no telhado da minha casa – tal como já o fizeram muitos outros cidadãos em Portugal.
Este sistema irá fornecer eletricidade para a iluminação, o aquecimento de águas sanitárias (AQS), o funcionamento de todos os eletrodomésticos, o aquecimento e arrefecimento da casa através de uma bomba de calor, bem como para a confeção de alimentos (placa de indução, forno, micro-ondas, entre outros).
E se, num dia de sol, não estiver ninguém em casa e não houver consumo? Ou seja, se houver produção excedente? Não há problema: essa energia será injetada na rede e poderá ser utilizada por alguém, noutro ponto do país.
O Decreto-Lei n.º 15/2022prevê precisamente esta possibilidade e estabelece um mecanismo de compensação para os pequenos produtores como eu, permitindo o recebimento de um valor pela energia excedente disponibilizada à rede. Contudo, o processo instituído é excessivamente burocrático e desajustado à realidade do autoconsumidor residencial. A legislação exige que, como pessoa singular, abra uma actividade específica nas Finanças (CAE 35123 – Produção de Electricidade de Origem Solar), essencialmente para efeitos de IVA. Isto por um benefício anual que, no meu caso, representa apenas algumas dezenas de euros de redução na fatura[1].
Esta exigência, além de desnecessária, tem consequências negativas: muitos cidadãos optam por instalar sistemas de menor dimensão para evitarem excedentes, ou então desistem da compensação por não quererem enfrentar o processo burocrático de abertura de atividade. Este comportamento trava a adesão à tecnologia fotovoltaica e prejudica o crescimento da produção descentralizada de eletricidade em Portugal.
lê: “(…)neste quadro (…) importa assegurar a mudança de paradigma do SEM-Serviço Elétrico Nacional, que tem, necessariamente, de evoluir de um sistema assente em produção centralizada, para um modelo descentralizado que enquadre no seu seio a produção local, as soluções de autoconsumo, a gestão ativa de redes inteligentes e que assegure a participação ativa dos consumidores nos mercados.”
É, por isso, urgente simplificar o regime de compensação – como já acontece noutros países que optaram por abordagens mais eficazes e menos penalizadoras.
Tome-se como exemplo o caso de Espanha: a energia injetada na rede é automaticamente valorizada a uma tarifa específica e o montante correspondente é deduzido na fatura do consumidor. Resultado? Em Espanha, a potência instalada por telhado é, em média, o dobro da verificada em Portugal.
Mas há um problema adicional: a energia excedente produzida por particulares é revendida pela rede e pelos comercializadores a outros consumidores, sem que tenham suportado qualquer custo na sua produção. O produtor assumiu todo o investimento no seu sistema fotovoltaico, mas a sua energia pode ser revendida sem retorno justo. Trata-se de uma situação, no mínimo, injusta e eticamente questionável.
Por tudo isto, lanço aqui um apelo claro e urgente: é necessário alterar – e de forma simples – o Decreto-Lei n.º 15/2022, seguindo o exemplo espanhol.
Enquanto isso, assumirei o esforço de abrir atividade própria para poder receber a compensação a que tenho direito. E procurarei, acima de tudo, maximizar o aproveitamento da energia que produzo, nomeadamente no aquecimento de águas e na climatização, utilizando a inércia térmica das paredes da minha casa para armazenar calor (ou frio) e tirar o máximo partido do meu sistema.