No mês passado, entre a euforia da vinda da Google para Lisboa e da Amazon para o Porto, houve uma notícia que passou despercebida à generalidade dos portugueses e cujo impacto, junto de potenciais investidores estrangeiros, poderá ter tanto de negativo como os outros dois de positivo.

Foi anunciado, pela a Autoridade da Concorrência (AdC), a abertura de uma investigação sobre o processo de aquisição pela RUBIS, dos ativos do negócio de distribuição de gás de petróleo liquefeito (vulgo GPL), à REPSOL, nos Açores e na Madeira.

Até agora, o mercado de GPL nos Açores e na Madeira era dominado por três operadores: a GALP, a REPSOL e a RUBIS, cuja posição resultou da compra, em 2014, pela multinacional francesa, do negócio de distribuição de gás GPL da BP Portugal. Um investimento de 115 milhões de euros, efectuado sem quaisquer apoios do Estado, num momento em que o país ainda se encontrava sob intervenção da famigerada troika.

Em meados de 2017, a REPSOL, de forma livre, decidiu reorientar os seus investimentos e reduzir a sua presença no nosso país, retirando-se do mercado insular de GPL. Naturalmente, como fazem todas as empresas que dispõem de activos em negócios que estão a descontinuar, procurou minimizar as suas perdas colocando estes activos à venda. A RUBIS, prosseguindo uma estratégia de investimento no nosso país, apresentou-se como única interessada e adquiriu-os.

Note-se que não é estranha ou errada a intenção da AdC em querer investigar este negócio e perceber se o mesmo coloca em causa a sã concorrência no mercado açoriano e madeirense de GPL. O que é estranho é, por um lado, parecer ignorar por completo as condicionantes de insularidade dos dois arquipélagos; e, por outro, os termos em que se afirma quase como uma oponente ao negócio, nomeadamente ameaçando avaliar “quais as perspetivas de entrada nos mercados das regiões autónomas de outros fornecedores de gás GPL, que possam contestar a posição de mercado da GALP e da RUBIS”.

Ficamos portanto a saber que existe uma “nova” AdC, cujas orientações não se resumem à regulação e avaliação dos potenciais impactos que um acontecimento tem sobre a concorrência num determinado mercado, estendendo-se agora também às funções de “angariador de investimentos” (qual AICEP) e de ostracização dos agentes económicos. Em suma, o regulador não só regula como “contesta” a posição dos operadores que estão no mercado.

Tal posição é ainda mais absurda se atendermos a que é pouco provável que a AdC consiga levar a cabo a sua demanda de encontrar outro fornecedor de gás GPL para as ilhas. Basta olhar para o interesse que os ativos da REPSOL despertaram.

E, nesta circunstância, o que vai acontecer? A REPSOL fica com o “mono” que não quer, o mercado mantêm-se igualmente nas mãos de dois operadores, ou, na pior das hipóteses, a RUBIS, privada da possibilidade de crescer, algo fundamental num mercado com estas características para potenciar ganhos de escala, farta-se de nós e sai do mercado.

Em qualquer das circunstâncias acima, pergunto: o que ganharam os consumidores açorianos e madeirenses com este tipo de intervenções da nossa Autoridade da Concorrência? Preços mais altos? Ficarem na mão de um único operador? Uma coisa é certa, mais concorrência e satisfação é que não.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.