Nos dicionários, em sentido figurado, dá-se o sinónimo de avalanche a “queda ruidosa de algo”. Portugal é um país, mesmo com pouca neve, sujeito a este tipo de acidentes. Senão vejamos: o novo ministro da Cultura, que gosta de música como milhões de portugueses, mas nada tem a ver com o sector, antes comandava as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.

Para o evento de lançamento, esqueceu-se de convidar Ramalho Eanes (a quem o próprio Marcelo Rebelo de Sousa teve de ligar a pedir desculpas) e Manuel Alegre que relatou o caso na imprensa e com o alarido de chamar a Pedro Adão e Silva de homem da “cultura de Festival da Canção”. Ora, o novo ministro defendeu-se afirmando que os convites não eram responsabilidade dele mas do Protocolo do Estado. Portanto, nem teve o cuidado de, no seu primeiro acto público, confirmar se tudo estava bem. Começam assim as avalanches, com pequenos episódios que se vão somando e transformando em maiores até ao triste barulho da queda de algo.

Outra área que tem vindo, à vista de todos, a ganhar uma avassaladora onda de danos reputacionais à sua actividade é a Justiça. Ainda há poucos dias o vice-Procurador Geral da República deixava o recado: “pela falta de meios vai acontecer uma avalanche de prescrições”. Reparem no termo: “avalanche de prescrições”. É gravíssimo.

É um sinal de preparação para a opinião pública de que muitos processos, naturalmente alguns dos mais conhecidos e que envolvem poderosos e alegados casos de corrupção, não vão ter sentença. Portanto, criaram-se culpados nas capas dos jornais, criou-se na percepção dos portugueses a ideia de que há juízes e procuradores que andam à caça dos maus mas que depois, na hora H, quando toca a poderosos, metem todos a viola no saco e esses maus continuarão no luxo das suas mansões a dormir em paz. O que será para a Justiça uma avalanche de vergonha e descrédito.

O que nos primeiros sinais tende para uma avalanche de problemas é também o relacionamento entre Belém e São Bento. Desde 2015 que tem acontecido uma parceria, de vez em quando com alguns azedumes, entre dois homens que se respeitam. Mas todos sabemos que num regime semipresidencialista, quando o pendor do poder passa para o primeiro-ministro em virtude de uma maioria absoluta parlamentar, o Presidente da República constipa-se. Mais ainda quando isso acontece no segundo mandato que marca muitas vezes maiores atritos entre Belém e São Bento.

Marcelo não se quer deixar apagar mas tem de compreender que a Presidência da República não é um partido e o Presidente não deve ser o líder da oposição, para isso existem as forças políticas partidárias. Logo, esperam-se quatro anos de estabilidade e de um Governo que faça as reformas necessárias no caminho do crescimento económico porque Portugal não pode perder mais nenhuma oportunidade numa altura que vai ser inundado por um saco de dinheiro do PRR.

A Marcelo pede-se que seja galvanizador dos portugueses e de causas justas, que seja um fiscalizador e tutor dos direitos, liberdades e garantias e não uma avalanche de rasteiras.

O autor escreve de acordo com a antiga ortograa.