A ideia de que avaliar é muito importante e positivo, sejam os objectos dessa avaliação as pessoas, as instituições, as empresas ou os países, tem uma grande aceitação no mundo actual. A filosofia subjacente é a de que temos que distinguir os bons dos maus (separar o trigo do joio), para podermos premiar os bons e penalizar os maus, criando assim os incentivos correctos para que a sociedade caminhe na direcção da contínua melhoria.
Na ausência de tais mecanismos, é argumentado, os bons sentir-se-iam desmoralizados por não verem a sua capacidade reconhecida, ao mesmo tempo que os maus se sentiriam confortáveis continuando a ser maus, pois que não eram penalizados. O resultado final seria uma sociedade disfuncional e a caminho da decadência ou, na melhor das hipóteses, com potencial subaproveitado.
Apesar deste princípio genérico, de que a avaliação é benéfica, parecer indiscutível, há muito para debater.
Primeiro, do ponto de vista ontológico: a avaliação trará tantos mais benefícios quanto mais diferentes assumamos que as pessoas são e na medida que os indivíduos se comportem adequadamente face aos incentivos criados por essa mesma avaliação. Se acreditarmos que os seres humanos são mais parecidos do que diferentes nas suas capacidades (por exemplo, que a competência humana segue a distribuição normal) e que nem sempre os incentivos da avaliação causam o comportamento esperado, podemos concluir que os esquemas de avaliação e ordenação podem não ser úteis (ou até perversos).
Depois, do ponto de vista metodológico: existem inúmeras formas de pôr em prática um sistema de avaliação. Qualquer sistema que nós escolhamos como método de avaliação está carregado de subjectividade e valores implícitos. Exemplos típicos passam pela tensão entre rapidez ou quantidade versus qualidade, pontualidade e assiduidade versus habilidade do improviso, ou ainda pela capacidade de cumprir regras versus criatividade.
Mesmo que um dado método de avaliação inclua todos esses parâmetros, somos confrontados com a importância relativa de cada um deles e com a dificuldade em quantificar as dimensões mais subjectivas. Na prática, nenhum método de avaliação é objectivo nem neutro do ponto de vista ideológico.
Dados todos estes problemas, levanta-se a questão: será que um qualquer método de avaliação é sempre melhor que nenhuma avaliação?
A resposta a esta questão não é óbvia. De facto, muitas são as situações em que não avaliar, ou dar pouco peso à avaliação, pode ser preferível a avaliar através de um método desadequado. Avaliar segundo esse método desadequando pode ser uma fonte de enorme perversidade, injustiça e até ineficácia, pois o comportamento dos avaliados pode muito bem ser contrário ao esperado, gerando-se sentimentos de revolta e baixa produtividade.
A lição final é simples: se quisermos introduzir um método de avaliação sobre qualquer realidade temos, primeiro, que pensar na ontologia em que acreditamos e na metodologia adequada. Finalmente, verificar, empiricamente, se o processo de avaliação está a produzir os resultados esperados.
A realidade tem-nos mostrado como muitos métodos de avaliação têm falhado: desde as classificações das agências de rating até aos rankings das escolas ou mesmo a classificação dos alunos (não é por acaso que em países muito desenvolvidos, como a Finlândia, os alunos não têm notas). Mais, em profissões como professores, médicos, magistrados ou polícias e militares, é muito difícil fazer-se uma boa avaliação, dada a importância da dimensão qualitativa em todas essas funções e a natureza de serviço público das mesmas.
No fim do dia importa perceber que todos os métodos de avaliação são ideológicos e que, em certas situações, uma dada avaliação pode ser desadequada e perversa, sendo, aí, preferível nada ou pouco avaliar.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.