Após uma interrupção superior a dois meses e em novo formato anunciado em agosto, foram retomadas esta semana as apelidadas “reuniões do Infarmed”, que se destinam a avaliar a evolução epidemiológica da Covid-19, com a presença de decisores políticos, parceiros socias, técnicos especialistas e investigadores das mais diversas entidades.
A primeira do novo formato foi realizada a Norte numa instituição de reconhecida excelência no ensino superior – a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto – num invulgar exemplo da desejável transparência que o Estado e as suas instituições, pagas por todos os portugueses, devem elas próprias promover (por missão e cumprimento da lei e não por exigências exteriores), com a transmissão pública das apresentações técnicas realizadas.

Após o anúncio anterior de que o país entrará em novo Estado de Contingência a partir de 15 de setembro, foi com renovada expectativa, não só pela nova configuração e transmissão pública mas também pelas dificuldades que se adivinham, que os portugueses aguardaram o que os jornalistas e os líderes políticos teriam a dizer ao país. Supostamente, este encontro seria decisivo para o rumo futuro, necessariamente de curto prazo e de monitorização e reavaliação permanentes da situação.

Precisamente por este motivo, foram certamente surpreendentes para a generalidade dos portugueses algumas das preocupações que terão sido discutidas no período de debate, este já à porta fechada, referenciadas por jornalistas e vários atores políticos, por exemplo, as relacionadas com a evolução verificada nos lares residenciais e serviços de ação social de apoio aos mais idosos.

O Presidente da Assembleia da República terá sentido mesmo a necessidade de questionar a evolução do cenário verificado nos últimos meses, com crescente visibilidade de episódios de instituições por todo o país que afinal enfrentam dificuldades que em nada divergem das visíveis debilidades da resposta do Estado a que assistimos no segundo trimestre do ano, apesar dos insuperáveis esforços de profissionalismo, abnegação e sentido de missão de serviço público dos seus trabalhadores , a par dos profissionais da economia social privada.

Se, numa primeira fase do segundo trimestre do ano, estas dificuldades poderiam, aos olhos de muitos, parecer compreensíveis e aceitáveis pela impreparação para uma situação inédita, neste momento, que deveria ser de prontidão de resposta a alguns cenários já previsíveis, e de maior dificuldade, que se avizinham, até por se sobreporem a um timing habitual de pressão e risco, motivado pela gripe, sobre o Serviço Nacional de Saúde e instituições de apoio social, públicas e privadas, não podem agora deixar de merecer um escrutínio com outra exigência na eficácia de respostas.

Não deixa de ser igualmente surpreendente, algumas semanas após as declarações da Ministra da Segurança Social desvalorizando, em comparação com outros países, a quantidade conhecida de infeções e de mortes em lares, que esta sessão de trabalho tenha integrado, e bem, duas apresentações que abordaram problemáticas relacionadas com o início do ano letivo, mas não tenha incluído uma abordagem à problemática destes portugueses que não podem ser deixados para trás.

Cá fora, a vida continua e muitos de nós tiveram oportunidade de retomar a possível e nova “normalidade”, com novos desafios diários, alguns inclusive, fazendo as merecidas férias. Lá dentro, os mais afortunados em qualidade de vida, confinados e limitados nas suas vivências com família e amigos assistem aos mesmos telejornais que nós e leem a mesma imprensa.

É urgente uma nova eficácia na capacidade de o Estado dar resposta a esta realidade. São preocupantes as mais recentes evidências de que continuamos a não conhecer a realidade das instituições, públicas e privadas, legais e ilegais, que acolhem e melhor deveriam cuidar de todos nós, precisamente quando mais fragilizados estamos. São preocupantes as evidências de que continuamos a não responder à necessidade de empreender uma metodologia e organização integrada, em todo o território nacional, de dar respostas de apoio social e na área da saúde que colmatem eficazmente as gritantes discrepâncias que os portugueses bem conhecem, desde logo no acesso e na qualidade do apoio prestado aos mais frágeis.

Agora não há desculpa, temos seis meses de experiência. Temos de saber cuidar, (re)avaliar e agir. Ninguém pode ser deixado para trás. O vírus não distingue realidades socioeconómicas. O vírus não distingue um lar legal de um lar ilegal. O Estado sim. E sabe bem porquê.