Na concessão de empréstimos, aos bancos cumpre apenas fazer a avaliação do risco (de incumprimento), mas não aferir da bondade dos projectos submetidos a pedido de crédito. E esta realidade assim crua choca o pensamento dos juristas habituados a considerar o devedor como a parte mais frágil da relação creditícia.

Mas, ao mesmo tempo, esta ideia desafia a uma ponderação fora da caixa, fora da matriz segundo a qual o desnível entre as posições negociais do credor e do devedor é de tal ordem que seria impensável admitir uma convenção de apropriação pelo credor, ainda que pelo valor real do bem, fixado por entidade independente, mormente por um tribunal.

Ora, esta aparente força desmedida de que o credor goza na fase de negociação do crédito fará dos bancos a formiga no carreiro? Não, porque, em cenário de incumprimento, a lei não oferece aos credores alternativa a encargos e delongas da execução das garantias.

O nosso sistema tenta o reequilíbrio de forças ao permitir que o devedor use o labirinto judicial para uma verdadeira corrida de gato e rato. Inaceitavelmente! Se tudo correr mal, não raras vezes, é o início da corrida dos devedores à dissipação de bens, divórcios fabricados e a todas as criativas formas de esvaziamento patrimonial.

O equilíbrio das posições negociais tem de fazer-se na fase de negociação do crédito e a lei tem de ser o fiel da balança, razão por que urge o debate sobre modelos de governação empresarial responsável, esclarecimento sobre direitos e deveres de credores e devedores e sobre quais são hoje as verdadeiras garantias, ainda que ocultas, como as que emergem dos negócios fiduciários, dos side-contracts e do universo pouco explorado da propriedade reversiva.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.