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Banco de Portugal já enviou ao Parlamento parecer sobre a lei que altera as regras de nomeação do governador

O parecer a que o Jornal Económico teve acesso foi entregue na sexta-feira ao Parlamento e distribuído nesta segunda-feira aos deputados da COF. O Banco de Portugal diz que a matéria do diploma é da competência dos “órgãos de soberania”, mas alerta para o risco de colocar “restrições excessivas” limitando em excesso a capacidade de recrutamento, remetendo ainda para a necessidade de ouvir o BCE.
29 Junho 2020, 12h53

O Banco de Portugal enviou na passada sexta-feira o parecer sobre o projeto de lei do PAN que altera as regras de nomeação do governador do Banco de Portugal, tal como estava previsto.

O parecer a que o Jornal Económico teve acesso foi distribuído nesta segunda-feira aos deputados da Comissão de Orçamento e Finanças (COF). Nele, o Banco de Portugal remete para o Direito da União Europeia que “contém algumas normas que se relacionam, ainda que de forma indireta, com a temática da nomeação dos Governador ou dos membros do órgão de decisão do banco central nacional, tendo sempre em vista os princípios estruturantes da organização do Sistema Europeu de Bancos Centrais, os quais, naturalmente, devem sempre ser respeitados”.

Em traços gerais o parecer do Banco de Portugal responde à Comissão de Orçamento e Finanças dizendo que “o objeto do diploma é da competência nacional, cabendo por isso aos órgãos de soberania nacionais decidir”. O Banco de Portugal diz também que “é conveniente não colocar restrições excessivas para não limitar em excesso a capacidade de recrutamento”.

No documento, o Banco de Portugal invoca a necessidade de consulta ao BCE, o que está já a decorrer, tendo o Banco Central Europeu pedido mais quatro semanas, o que foi aceite, apesar de inicialmente ter sido pedido o carácter de urgência que reduz o prazo de resposta de 30 para oito dias.

No documento a que o JE teve acesso, a instituição ainda liderada por Carlos Costa refere que “nos Tratados europeus e nos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais/Banco Central Europeu pode encontrar-se uma referência às qualificações necessárias do Presidente, Vice-Presidente e os membros da Comissão Executiva do Banco Central Europeu (BCE), que são
nomeados pelo Conselho Europeu “de entre personalidades de reconhecida competência e com experiência profissional nos domínios monetário ou bancário”. Salvaguardando que esta regra não se aplica à designação dos Governadores ou dos membros do órgão de decisão dos bancos centrais nacionais, o Banco de Portugal refere que é “por vezes, utilizada como parâmetro pelas legislações nacionais para a sua nomeação”.

“Os Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais/BCE estabelecem ainda que os estatutos dos bancos centrais nacionais devem prever, designadamente, que o mandato de um Governador de um banco central nacional não seja inferior a cinco anos”, lembra a instituição.

“Anote-se ainda que no enquadramento do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Mecanismo Único de Supervisão está apenas prevista, a esse propósito, uma declaração de interesses, no artigo 10.º do Código de Conduta dos Altos Responsáveis do Banco Central Europeu (que se aplica, entre outros, aos membros do Conselho do BCE e do Conselho de Supervisão do BCE),
através da qual o titular do cargo em causa presta informação sobre a sua atividade profissional anterior, atividades privadas, mandatos oficiais e interesses financeiros”, lê-se no documento.

Por seu turno, acrescenta o Banco de Portugal,  “a doutrina do BCE, desenvolvida através dos seus pareceres e sistematizada nos Relatórios de Convergência, não se tem debruçado sobre eventuais períodos de incompatibilidade (cooling-off) no quadro da designação do Governador ou dos membros dos órgãos de decisão dos Bancos Centrais Nacionais”. Não obstante, “atento o objeto do Projeto de Lei n.º 365/XIV/1.ª, cumpre ao Banco de Portugal assinalar, nesta oportunidade, a necessidade de consulta ao BCE, em decorrência do n.º 4 do artigo 127.º e o n.º 5 do artigo 282.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, tendo em conta, igualmente, o disposto no artigo 2.º, n.º 1, terceiro travessão, da Decisão do Conselho, de 29 de junho de 1998 (98/415/CE)”, diz o BdP que remete assim para o BCE cuja parecer foi pedido.

No entanto, na última alteração à nomeação do Governador do BdP, que datou de 2015 e que impôs a regra de audição prévia à comissão parlamentar competente, seguida de parecer não vinculativo, não houve audição prévia ao BCE.

Em conclusão, o banco central refere que o “o Projeto de Lei n.º 365/XIV/1.ª situa-se, claramente, na referida esfera de soberana disposição por parte do Legislador nacional no que respeita à configuração do modelo português de designação do Governador do Banco de Portugal e demais membros do respetivo Conselho de Administração”.

“No quadro de tal margem nacional de disposição normativa quanto ao referido modelo de designação do Governador e demais membros do Conselho de Administração do Banco de Portugal, afigura-se, ainda assim, pertinente alertar para a necessidade de ponderação acrescida em sede de procedimento legislativo, de modo a que as restrições legais que possam vir a ser consagradas a este propósito não se revelem excessivas, pois, em tal caso, poder-se-ia reduzir significativamente o universo de designação para titulares de tão complexas funções”, conclui o Banco de Portugal, que apela assim a que não implementem regras que possam reduzir o universo de designação para a administração da instituição no futuro.

Ao contrário do Banco Central Europeu (BCE) que pediu mais quatro semanas para emitir parecer, o banco central nacional cumpriu o prazo inicialmente estipulado pela Comissão de Orçamento Finanças (COF) quando remeteu o pedido aos dois supervisores bancários com caráter de urgência.

Este pedido do BCE foi dirigido ao presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, que o comunicou à Comissão de Orçamento e Finanças, onde o projeto de lei do PAN está a ser debatido na especialidade.

Apesar de ter pedido os pareceres com caráter de urgência, o Parlamento decidiu afinal suspender por quatro semanas a apreciação na especialidade do projeto do PAN que altera os critérios de nomeação do governador do Banco de Portugal até chegar o parecer requerido ao Banco Central Europeu (BCE).

O presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, o socialista Filipe Neto Brandão, respondeu , citado pela Lusa, que um eventual caminho que passasse por “manter o prazo original, não obstante a tempestiva solicitação de prorrogação de prazo pelo BCE, seria, assim, não apenas uma descortesia institucional, mas igualmente uma recusa indevida ao pedido formulado, com as legais consequências”. Assim, ainda segundo a Lusa, escreveu “defiro, pois, o solicitado pelo BCE e, em conformidade, determino que, até ao decurso do prazo solicitado (por quatro semanas suplementares), se sobrestarão na comissão todos os trâmites procedimentais que, relativamente ao projeto de lei em causa, se seguiriam ao termo do prazo originalmente concedido àquela entidade para emissão de parecer”.

A votação final global do projeto do PAN – já aprovado na generalidade com os votos contra do PS, abstenções do PCP e PEV, e com o apoio do PSD, Bloco de Esquerda, CDS e Iniciativa Liberal – estava prevista para 3 de julho. Mas assim agora deverá ser adiada, atirando o processo legislativo para depois da nomeação de Mário Centeno para governador do Banco de Portugal.

Os deputados têm dito que o parecer do BCE não é vinculativo, e que “a lei é clara e diz que o Estado-membro pode avançar com o processo legislativo de regulação das regras de nomeação do Banco de Portugal sem que esse parecer tenha dado entrada”, chegou a referir o responsável do PAN, André Silva.

Em causa está a imposição de um período de nojo entre a saída do Ministério das Finanças e a assunção do cargo de Governador do Banco de Portugal. O projeto de lei do PAN prevê a regulamentação do tal período de intervalo, por um lado, e a implementação de um parecer, por parte do parlamento, que seja vinculativo ou que pelo menos tenha uma votação por parte dos partidos.

Na quarta-feira será agendada a audição do indigitado na Comissão de Orçamento e Finanças, já requerida na semana passada por António Costa.

O primeiro-ministro escreveu ao presidente da Assembleia da República a comunicar a proposta do Governo para nomear o ex-ministro das Finanças Mário Centeno para o cargo de governador do Banco de Portugal. “É intenção do Governo, na sequência de proposta do senhor ministro de Estado e das Finanças [João Leão], designar o professor doutor Mário Centeno para o cargo de governador do Banco de Portugal”, lê-se na carta enviada por António Costa a Ferro Rodrigues.

Na mesma carta o primeiro-ministro pede depois que “seja requerida a audição do indigitado na comissão parlamentar competente, nos termos do disposto na lei orgânica do Banco de Portugal”.

No final do Conselho de Ministros da semana passada, António Costa afirmou que já transmitira aos partidos com representação parlamentar a intenção do Governo em relação à sucessão de Carlos Costa no cargo de governador do Banco de Portugal.

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