[weglot_switcher]

Bastonário dos Advogados defende voto eletrónico nas eleições da Ordem

O bastonário dos Advogados diz que a modernização da Ordem será a prioridade se for reeleito e acusa as candidaturas rivais de “populismo”.
4 Agosto 2019, 19h00

O bastonário dos Advogados recandidata-se nas eleições previstas para o final deste ano e aponta a modernização da Ordem como a prioridade para um eventual segundo mandato. Guilherme Figueiredo diz não compreender a oposição de dois outros candidatos, Luís Menezes Leitão e António Jaime Martins, à introdução do voto eletrónico. “É mais barato, rápido e fiável que o voto em papel”, diz.

O que ficou por cumprir do seu programa?
O que pode ficar por fazer é a modernização, nomeadamente o voto eletrónico. Essa é para mim uma questão central, porque tem uma enorme vantagem: qualquer advogado pode votar onde quer que esteja (no país ou fora, no escritório ou fora…), utilizando os meios tecnológicos que hoje estão à disposição. Além disso, do ponto de vista ambiental, é importante. Acima de tudo, é um método fiável, auditável, uma forma de votar que permite um resultado rápido e fica 40% mais barato. Estamos a falar em quase 100 mil euros. Estes são os ingredientes. A facilidade de votar permite tentar que um maior número de advogados vote nas eleições. Há outro ponto fundamental, que é a circunstância do voto em papel permitir uma intrusão de terceiros nesse mesmo voto. Aquelas histórias que se contam do caciquismo são próprias do voto em papel.

Os sistemas informáticos da Ordem estão aptos para receber essa tecnologia?
Não serão os sistemas informáticos da Ordem. Faremos a contratação de uma empresa terceira com experiência no mercado. Neste momento há mais do que uma empresa, portanto iremos ao mercado. É preciso ter essas distâncias para não haver problemas. Já fizemos uma experiência no voto para o Congresso. Então, porque é que existem candidatos a bastonário com posições contrárias? Duas pessoas com responsabilidades na Ordem – presidente do Conselho Superior [Menezes Leitão] e do Conselho Regional de Lisboa [António Jaime Martins] – estão contra o voto eletrónico e eu falo com os colegas e todos se mostram favoráveis, por ser mais fiável e mais barato.

O que alegam é que não foi feita a auditoria pedida…
Não temos nenhum pedido de auditoria. Não é verdade. Se quiserem fazer uma auditoria podem-na fazer. Até aí o processo é mais fiável. Ouvem-se histórias, até de votações autárquicas, de quando o voto é em papel aquilo que tinha sido contado nas mesas não correspondia ao que era contado noutras circunstâncias. No eletrónico o que está lá é o que está lá. Mais: não é possível seguir o caminho da votação. Com o papel, os delegados da lista vão seguindo a votação, vendo quem vota e quem não vota, porventura fazendo uns telefonemas e interferindo. O papel tem um lado de caciquismo que o electrónico não tem, de ser potencialmente influenciador daquilo que é o voto dos advogados.

Após os conhecidos ataques informáticos, a Ordem também reforçou o investimento em cibersegurança?
A Ordem tem investido muito nesta área. Estamos muito melhor do que o que estávamos, mas recorreremos a uma das empresas que estará melhor preparada. Aquelas que temos em catálogo têm currículo e experiência. A Ordem não pode ficar para trás. Temos a assembleia geral (AG) marcada para dia 29 e espero que a advocacia portuguesa, que costuma estar à margem destas coisas, apareça.

A data tem merecido críticas devido ao período de férias judiciais. O que motivou a escolha?
Sim, mas tínhamos de marcar. Temos eleições em novembro. Preparar tudo isto demora muito tempo. O facto de ser nas férias judiciais não quer dizer nada, porque é em julho. Os colegas que não conseguem ir podem passar procuração. As AG nunca foram muito participadas, a não ser numa dada altura. Há colegas que se fazem representar por um terceiro que vem. Não altera nada. São desculpas e retórica eleitoral de quem, por razões dessa retórica, não quer que se faça. É para colocar em crise o Conselho Geral e o bastonário. Hoje os advogados trabalham através de plataformas informáticas – Citius, SITAF – e estão habituados. Quem não estiver, temos um sistema preparado aqui para poderem ir às respetivas áreas dos conselhos – com exceção do regional de Lisboa que será no geral – onde podem aproveitar para votar com apoio técnico, se for necessário. Não consigo perceber a argumentação contra o voto eletrónico.

O seu mandato ficou também marcado pela alteração nas quotas. Que valor a Ordem ainda tem por receber? Que medidas estão a ser tomadas para liquidar essas dívidas dos associados?
Ainda temos um grande valor de quotas em atraso. Melhorámos muito nessa matéria, principalmente nos pagamentos e na sinalização que demos: começar logo a limpar a casa. Não era só ter cerca, ou acima de, sete milhões em dívida por parte de colegas era a parte da cultura. Que cultura era essa? Não tinha a nada a ver com gestão do dinheiro de terceiros. Quando chegámos não havia nenhuma ação intentada contra um colega. Era indiferente se pagava ou não, o que era injusto para quem pagava. E também não era razoável haver quem não pagava e podia pagar, como acontecia com muitos. Não foi fácil fazer esse trabalho. Começámos logo por ter o problema de quem tinha competência para executar as quotas – o Tribunal Judicial Cível, o Administrativo, o Fiscal, a Autoridade Tributária. Ninguém se entendia.

Percebemos que os tribunais se consideravam incompetentes e que, do ponto de vista legal, a Autoridade Tributária (AT) era única entidade que tinha competência. A AT entendia que não, e tínhamos aqui um problema de “terra de ninguém”. Durante meses e meses foi preciso fazer reuniões, discutir os assuntos até ficar definido que seria a AT. Depois, a AT não estava preparada com uma plataforma imediata para que a Ordem avançasse com as ações para cobrar as quotas. Mas isso foi feito e, neste momento, estão a seguir as ações, estando os colegas a ser previamente notificados pela OA para pagar. Estamos a realizar este processo por fases, dando prevalência a acordos. Conseguimos fazer um acordo com a AT para que a Ordem possa usar um novo mecanismo para esse fim, o Web Services. Vai começar a funcionar em setembro e deixará de ter o sistema atual de pôr quota a quota, com juros. Este serviço será direcionado de forma eletrónica e direta para a AT, disponibilizando a informação necessária para a cobrança de quotas. Para a OA significa menos 90% do trabalho que temos atualmente.

Na altura da sucessão para a anterior bastonária houve também uma série de processos que foram para averiguação do Ministério Público. Tem segurança para dizer que, caso não seja reeleito, entregaria a casa sem estes problemas e com os vícios corrigidos?

Os vícios nessas matérias estão todos corrigidos. Em primeiro lugar, porque tudo o que aqui se faz é através de procedimento próprio e as contratações através de contratação pública, o que não existia. Houve vários problemas a esse nível. Neste momento, estamos completamente à vontade. Naturalmente, tivemos de criar uma estrutura diferente e fazer contratações para um funcionamento fluido e seguro. Venha quem vier, recebe uma casa completamente diferente.

A sua eleição foi vista como uma vitória de uma certa tendência que ia contra uma gestão mais populista da Ordem. Acha que voltou a haver esse género de disputa?
Se pegarmos no exemplo do voto eletrónico, há pelo menos duas candidaturas que mantêm essa lógica populista. Confesso que não perco tempo com certas questões, a não ser que sejam enviadas e discutidas. Por exemplo, não respondo a cartas abertas. O que se vai verificando é que há um discurso que tenta ir ao encontro daquilo que algumas pessoas querem ouvir. Não é esse o meu estilo. A escolha continua a ser livre e os advogados dirão aquilo que entendem. Há uma coisa absolutamente certa: não vou nem quero criar nenhum partido político, o que me distingue de alguns. Também não quero fazer carreira política. O que me interessa é que o que está por resolver seja resolvido, tendo como finalidade os advogados, o Estado de Direito Democrático, a defesa dos direitos, liberdades e garantias do cidadão. Não ter uma perspetiva meramente corporativa, mas a defesa do advogado estar integrada em algo maior. Por convicção, entendo que não é possível ter um Estado de Direito Democrático sem a advocacia forte, por isso hoje temos combates diferentes muito mais importantes: os relacionados com as recomendações da OCDE e da Autoridade para a Concorrência, que se seguissem para a frente conduziriam a uma quase dissolução da advocacia. Nem todos podem ser advogados, contrariamente ao que pensam os economistas da OCDE e da Europa. É uma profissão que, simultaneamente participa na administração da justiça e está na primeira fila da defesa do Estado de Direito Democrático.

Artigo publicado na edição nº1998, de 19 de julho, do Jornal Económico

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.