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BCE: Agravamento do risco italiano deverá obrigar Draghi a dar um passo atrás

A disputa entre Itália e a Comissão Europeia será um tema incontornável nas questões colocadas ao presidente do BCE após a reunião de política monetária desta quinta-feira. A expetativa dos analistas é que mostre cautela e mantenha o silêncio sobre a primeira subida dos juros de referência na zona euro.
25 Outubro 2018, 07h43

O Banco Central Europeu (BCE) reúne-se esta quinta-feira para uma debater a política monetária da zona euro. O encontro faz parte do agendamento regular da instituição, mas a situação criada pelo embate entre Itália e a Comissão Europeia nos mercados financeiros deverá obrigar o presidente Mario Draghi a redobrar a cautela.

“Não esperamos que o Banco Central Europeu tome quaisquer decisões, ou forneça mais detalhes sobre a sua orientação futura, na sua reunião desta quinta-feira”, afirmou Franck Dixmier, global head of fixed income da Allianz Global Investors.

A posição é consensual, sendo que há diversas razões apontadas para que Mario Draghi não faça qualquer movimento brusco. O banco central cortou a compra líquida de ativos de 30 mil milhões de euros para 15 mil milhões por mês em outubro, tal como tinha anunciado em junho. Os analistas acreditam que o BCE irá reiterar a intenção de finalizar as aquisições em dezembro.

“O BCE apoiará também a manutenção de condições financeiras acomodatícias com o reinvestimento do capital das obrigações no balanço e a reunião poderá fornecer detalhes técnicos sobre a implementação destes reinvestimentos”, indica a equipa de research do BPI / Caixabank.

“Por último, a avaliação do cenário económico (face à recente turbulência financeira e ao abrandamento da atividade económica) irá dar pistas sobre o timing em que pode ocorrer o primeiro aumento de taxas em 2019″, apontam, numa nota a que o Jornal Económico teve acesso. A reunião acontece numa altura crítica para a estabilidade da zona euro.

Incerteza sobre Itália pressiona Draghi

O Governo italiano e a Comissão Europeia chegaram a um impasse no que diz respeito ao Orçamento do Estado para 2019. Numa decisão inédita, Bruxelas rejeitou esta terça-feira a proposta e pediu uma versão retificada a Itália, que respondeu não só que não tem plano como que não se rende. A reação imediata foi de desvalorização de bolsas e moeda, acompanhada de agravamento dos custos de financiamento.

Esta quarta-feira, a moeda única depreciou-se face às principais, tendo tocado mínimos de dois meses, nos 1,1379 dólares. Nas bolsas, o português PSI 20 deslizou 0,01% para 4.932,20 pontos (pressionado pelo tombo de 2,06% do BCP) e o italiano FTSE MIB caiu 1,69%.

No mercado de dívida, após as fortes subidas nos juros das obrigações dos países da zona euro, na terça-feira, o dia seguinte foi de correções. A yield das obrigações portugueses a 10 anos recuaram 2,6 pontos base para 1,98%, por exemplo. A exeção foi, sem surpresas, Itália, cujos juros da dívida benchmark avançaram 1,3 pontos para 3,605%.

O BPI / Caixabank apontam a questão como principal risco. “A intensificação das tensões em torno de Itália poderia acabar por contagiar as restantes economias e agravar as condições financeiras na Europa”, afirmam, apontando ainda para a guerra comercial, o sobreaquecimento da economia norte-americana e a turbulência nos emergentes.

Até aqui, o presidente Mario Draghi tem mantido um discurso focado num equilíbrio de riscos neutro na zona euro. No entanto, deverá ser questionado se Itália compromete o crescimento económico europeu e se poderá influenciar o curso da política monetária na região, incluindo a eventual subida das taxas de juro de referência (atualmente em mínimos históricos).

Primeira subida dos juros deverá continuar em aberto

“O BCE deverá ainda manter-se vago sobre o momento em que pretende subir os juros, no que seria a primeira subida desde 2011. Confrontado com as altas expetativas do mercado, o banco central vai ter de decidir entre transparência e flexibilidade. É essencial que o BCE mantenha margem de manobra suficiente no ambiente atual, o que é complicado tanto devido a ciclos económicos divergentes como a múltiplos riscos para o crescimento global e a estabilidade financeira”, afirmou Dixmier.

O global head of fixed income da Allianz GI sublinha que a ata da última reunião do BCE, divulgada a 11 de outubro, revelava que os membros do BCE discutiram – pela primeira vez – a pressão dos custos internos, em resultado da elevada taxa de utilização da capacidade produtiva na zona euro e da tendência para salários mais elevados, numa altura em que a inflação de referência se mantêm em 0,9%, face à meta de 2% do banco central.

“Mas vai ser interessante observar até que ponto esta visão evolui durante a próxima reunião do BCE – especialmente dados os riscos colocados, entre outras questões, pela crescente crise em Itália. Itália representa um problema particularmente crucial já que as suas ações põem em causa a credibilidade das regras do próprio euro”, afirmou ainda Dixmier.

“Neste cenário, acreditamos que a orientação futura do BCE sobre a subida dos juros vai evoluir de forma pragmática nos próximos meses, tornando-se mais precisa à medida que nos aproximamos do verão de 2019”, acrescentou.

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