Desde a falência do Lehman Brothers, em Setembro de 2008, o Banco Central Europeu (BCE) tem descido sucessivamente as suas taxas de juro de referência, tendo a última queda ocorrido há mais de seis anos, em Março de 2016. Entretanto, também tem recorrido a programas de expansão quantitativa, uma outra forma de estimular a economia por via monetária. Quando se iniciou a pandemia, o BCE reforçou aqueles programas, esperando contribuir para limitar a recessão profunda que se instalou.

Pouco depois do início da recuperação, as coisas começaram a complicar-se, na Primavera de 2021, quando a subida dos preços da energia começou a fazer subir a inflação, que ultrapassou a meta dos 2% em Julho, tendo acelerado ininterruptamente desde então, atingindo 5,9% em Fevereiro e um máximo de 7,5% em Abril.

É curioso revisitar a evolução das taxas de juro de longo prazo dos últimos 12 meses. Na Alemanha, a taxa de juro a 10 anos da dívida pública passou de -0,3% antes da subida da inflação em 2021, para 0,23% antes do início da guerra e para 0,94% no final de Abril. Em Portugal, nas mesmas três datas, a taxa de juro equivalente foi de 0,2%, 1,45% e 2,02%.

Ainda que o BCE não tenha alterado em nada as suas taxas de referências, as taxas de juro de mercado já subiram, de forma muito pronunciada. Na zona euro, os países com um bom historial de inflação antes da entrada no euro, como a Alemanha, usam contratos a taxa de juro fixa. Países com fracas credenciais anti-inflacionistas, como Portugal, usam taxas de juro variáveis, hoje em dia as Euribor, mesmo mais de vinte anos depois de aderir a uma zona monetária de baixa inflação.

Isto significa que a política monetária já ficou claramente mais restritiva na Alemanha, enquanto em Portugal se mantém largamente expansionista. Esta diferença de resposta dos diferentes Estados Membros às taxas de juro é um dos elementos de dificuldade das decisões do BCE.

Como estamos em presença de uma inflação com origem, sobretudo, na oferta, os bancos centrais não têm escolhas fáceis. Se subirem muito as taxas de juro, podem debelar a inflação, mas arriscam-se a criar uma recessão. Se o aumento for insuficiente, não conseguem conter a inflação, arriscando-se a criar expectativas de manutenção de inflação elevada. Tem que se reconhecer que o medo de gerar expectativas de inflação permanente é que tem levado o governo português a ser tão restritivo na subida dos salários dos funcionários públicos.

É nesta posição que o BCE se encontra actualmente, admitindo-se que venha a iniciar o seu ciclo de subidas de taxas de juro na sua reunião de Julho.

Se a situação do BCE já é, hoje, ingrata, é bem possível que ela se venha a tornar ainda menos invejável nos próximos tempos. Sobretudo se avançarem medidas de diminuição de importações de produtos energéticos da Rússia, que tem todas as condições de reforçar a desaceleração da economia e acelerar os preços.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.